Há umas semanas atrás, postei este conteúdo e fui malhado feito Judas de páscoa, mesmo já estando em maio. Mas agora li uma notícia que reascendeu na minha cabeça o assunto, então estou postando novamente. Já ouvi muita gente falar que o nosso idioma é o mais bonito do mundo. E quando o leio em algum livro, eu até concordo. Mas, quando "nóis fala" nossa querida língua portuguesa, tenho cá minhas dúvidas sobre a realidade dessa afirmação. |
Enfim, na prática não faz muita diferença falar da forma correta ou incorreta, formal, informal, culta, popular. Todo mundo entende. Eu entendo. Nem sou um grandiosíssimo conhecedor do idioma... Por outro lado, não podemos deixar de lado a importância de se preservar uma língua
E sabem o por quê?
Acontece que a língua faz parte da cultura de um povo.
Normas cultas de escrita são relativamente recentes. Se você não acredita, medite na minha experiência: observando alguns livros religiosos do século XVI, por exemplo, reparei o nome do apóstolo João escrito em português de várias formas:
JOAM
JOAO
JOAN
JOÃO
JOAO
JOAN
JOÃO
Eu gosto de livros antigos, mas não sei muito da história de sua produção. O que sei é que, se em livros da mesma época cada um escrevia do jeito que achava melhor, a gramática antiga deveria ser uma Festa da Uva.
Enfim, para não fugir do assunto, vou explicar o motivo desse post. Li hoje de manhã que, segundo o Ministério da Educação (MEC), o uso da língua popular, ainda que com seus erros gramaticais, é válido.
Ok, claro que é. Como eu disse no começo do post, a ideia é ser entendido. “Utilizar-se de um método de expressão oral altamente rebuscado” em nossa comunicação não ajuda muito a fazer-se entender.
Mas, quando um órgão supremo de regularização educacional avaliza um material que prega que falar errado não é necessariamente um problema, como é o caso do livro “Por Uma Vida Melhor”, da Editora Global, eu começo a ficar preocupado.
Em uma parte, o livro diz:
"Você pode estar se perguntando: `Mas eu posso falar 'os livro'?. Claro que pode. Mas fique atento porque, dependendo da situação, você corre o risco de ser vítima de preconceito linguístico. Muita gente diz o que se deve e o que não se deve falar e escrever, tomando as regras estabelecidas para a norma culta como padrão de correção de todas as formas linguísticas".
Este livro citado foi distribuído pelo Programa Nacional do Livro Didático para a Educação de Jovens e Adultos a 484.195 alunos de 4.236 escolas, informou o MEC.
Em nota enviada pelo ministério, a autora Heloisa Ramos diz que "o importante é chamar a atenção para o fato de que a ideia de correto e incorreto no uso da língua deve ser substituída pela ideia de uso da língua adequado e inadequado, dependendo da situação comunicativa".
Nesse ponto eu até concordo em partes com a autora. Eu não posso, por exemplo, chegar no MDIG e no E-zap e escrever um texto com todas as normas cultas, por dois motivos: o primeiro é que não as domino 100%. O segundo é que meus leitores tem vários níveis de formação e podem não entender bem a mensagem a ser transmitida.
Mas, este método de “adequado” e “inadequado” é, ao meu ver, um fator preocupante. O certo seria todo mundo falar a língua corretamente.
Se o governo parasse com essa história ridícula de bolsa família, bolsa escola, bolsa raio-que-o-parta, bolsas estas feitas com o couro da classe média, e se preocupasse de verdade em prover educação a todos os brasileiros (não me venham dizer que isso é impossível), e se preocupasse também em fazer as escolas ensinar o jeito certo, não teríamos a necessidade de um livro para dizer que falar errado pode ser adequado em certas situações, simplesmente porque ninguém iria falar errado.
Ah, então falar errado não é um problema? Tudo bem, então não é.
Só que o caboclo que fala errado, vai escrever errado também. E se ele escreve errado o seu próprio idioma, está quebrando um código importante, está colaborando para a morte das normas, e sem normas de uso, tudo acaba caindo na degradação: seja um local público, um bem público, um domínio público – como acredito que seja um idioma.
“Muita gente diz o que se deve e o que não se deve falar e escrever, tomando as regras estabelecidas para a norma culta como padrão de correção de todas as formas linguísticas”.
Eu sou uma dessas pessoas. Cultura não é ruim. Normas não são ruins. Falar corretamente não é ruim.
A editora Global disse à reportagem que eu li, por meio de sua assessoria de imprensa, que é responsável pela comercialização e produção do livro, e não pelo conteúdo. E claro que não é, mesmo. A editora não escreve livros. Ela até formata, imprime... mas não escreve.
E acho que nem a autora pode ser julgada, afinal, ela deve ter escrito, a pedido do Ministério, algo que se encaixasse nos projetos de educação nacionais, e também não podemos desmerecer o trabalho dela: além de publicar um trabalho ser uma glória para um profissional, o livro deve ter uma porção de ensinos importantes, inclusive deve ensinar sim boa parte das normas da nossa língua culta. Eu não sei, eu não vi o livro em minhas mãos.
Sei que terá quem entre nesse post para dizer que estou errado, que sou preconceituoso, metódico/chato, parente do Pasquale ou algo assim. Vou correr este risco. Vou correr este risco porque eu acreditava muito que a leitura e a escola podiam salvar o nosso querido idioma.
Graças a um cara de bom senso no DPU, talvez este livro não venha a circular. O argumento do defensor é o mesmo que tenho derramado a todos desde o começo.
PS.: quem me ameaçou por e-mail desapareceu, mas pensando bem, pelo tom da linguagem, devia ser um troll. Eu devia ter levado mais a sério essa possibilidade... ¬¬
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Comentários
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Falar de forma coloquial não é fala errado. A língua é viva e dinâmica e sempre está se adequando ao falantes.
Nossa língua pode ser bonita mas os "Imortais" da ABL fodem como nossa vida a anos, definindo regras em cima de regras, em vez dos mesmos atualizarem a língua de forma a torna-la mais simples e direta fazem totalmente o contrário.
Se fosse apenas as regras de gramática ainda era possível que todos aprendessem, mas as regras possuem inúmeras exceções.
Concordo com o MEC, se locutor fala e o interlocutor entende de forma clara e concisa não há nada de errado nisso, a finalidade da língua foi alcançada.
Que beleza... De que adianta haver normas gramaticais se o próprio MEC praticamente diz que não há problema em falar errado?
Moon, ótimo post!
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