Estima-se que 35.000 morsas foram fotografadas pela primeira vez em terra em 27 de setembro de 2014 perto de Point Lay, no Alasca, durante a pesquisa aérea anual de mamíferos marinhos do Ártico da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica (NOAA). Aquela foi a primeira vez que os pesquisadores avaliaram que a chegada das morsas na costa era um fenômeno que acompanhava a perda do gelo marinho no verão à medida que o clima esquentava. O recuo extremo do gelo marinho do Alasca no verão levou um grande número de morsas a deixar a água para locais em terra, em vez de descansar no gelo offshore. |
Morsas em grande número foram vistas pela primeira vez no lado americano do Mar de Chukchi em 2007. Elas retornaram em 2009 e, em 2011, os cientistas estimaram 25.000 morsas ao longo de um trecho de um quilômetro de praia. Em 2014, uma pesquisa da NOAA contou cerca de 35.000 morsas na praia perto de Point Lay.
Isso tudo é muito esquisito, porque as morsas, uma espécie vulnerável devido a pesada caça predatória do século XIX com a exploração comercial da gordura e do marfim de suas presas, tendem a viver em bandos de não mais que cem ou duzentos indivíduos. A concentração revelava que alguma coisa muito errada estava acontecendo.
Em 2018, cientistas do Serviço Geológico dos Estados Unidos voltaram a praia de Point Lay e ficaram boquiabertos com o que viram: cerca de 45 mil morsas repousavam ali devido a falta de gelo. Um dos grandes problemas resultante dessas reuniões multidinárias é que os filhotes ficam mais propensos a serem pisoteados pelos machos nessas enormes extensões de terra.
A fêmea da morsa do Pacífico e seus filhotes tradicionalmente passam os verões longe da costa, mergulhando em busca de invertebrados bentônicos nas águas rasas da plataforma continental do mar de Chukchi. Elas preferem descansar entre os ataques de forrageamento no gelo do mar à deriva acima de suas áreas de alimentação, mas o que acontece então quando não há mais gelo? Machos, fêmeas e filhotes fogem para a costa causando esta enorme conglomeração, mas a história é ainda mais triste.
À medida que o gelo encolhe, as morsas são obrigadas a deslocar-se nesses grandes grupos para pequenas faixas de praia geralmente mais próximas de suas áreas de alimentação. Para evitar o amontoado, ou quando o espaço de descanso é escasso, alguns pinipedes começam a fazer algo que eles simplesmente não sabem: escalar áreas escarpadas para encontrar espaço para descansar. No triste vídeo abaixo, que mostra os bastidores da gravação da série Our Planet, o cinegrafista James McPherson disse que foi a cena mais difícil que ele teve de gravar na vida.
Ocorre que, após descansar, as morsas dependuradas nas falésias querem voltar à água para caçar. Como uma animal que pouco sabe se movimentar em terra, elas começam a se lançar no vazio provavelmente porque não entendem que a queda as matará. Segundo a equipe da produção, cerca de 300 morsas morreram no processo.
A percepção de profundidade das morsas em terra não evoluiu o bastante para fazer frente a uma situação como essa, tampouco evoluíram para descobrir como regressar por onde vieram. De modo que poucas delas conseguem voltar à água.
E isto não está afetando apenas as morsas-do-Atlântico (Odobenus rosmarus rosmarus), pois as morsas-do-Pacífico (Odobenus rosmarus divergens) estão enfrentando as mesmas adversidades. O seguinte documentário "Haulout", indicado para Melhor Curta Documentário no Oscar de 2023, foi realizado pelos produtores Evgenia Arbugaeva e Maxim Arbugaev. Ele mostra um cientista solitário em Tiksi, na costa da República de Sakha, Sibéria, que descobre como o aquecimento dos mares afetou a migração das morsas.
Grande respeito aos cineastas e ao biólogo pelo que acabei de ver. Eu não vejo um filme tão incrível em muito tempo. O documentário, embora sem manchetes de destaque ou textos enfadonhos, mostra a tragédia de como o aquecimento global lenta mas irrevogavelmente está virando a vida no planeta de cabeça para baixo, quebrando seu ritmo habitual.
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