Depois de um confronto bélico ou um desastre natural, surgem os terríveis números, quantificadas normalmente com quatro dados: sobreviventes, mortos, feridos e desaparecidos. Lamentavelmente, grande parte deste último grupo costuma engrossar o número de mortos, mas em ocasiões, como se tratasse de um milagre, aparecem sãos e salvos anos depois. Esta é a história do alemão Georg Gaertner, que no fim da Segunda Guerra Mundial sumiu do mapa durante décadas. |
As circunstâncias do desaparecimento do alemão Gaertner são muito diferentes às dos soldados japoneses, Shoichi Yokoi e Hiro Onoda, que já reportamos em outros artigos do MDig, mas igualmente permaneceu escondido durante décadas.
Georg Gaertner se alistou na Wehrmacht em 1940 aos 19 anos e lutou na campanha do Norte da África. Foi capturado pelas tropas aliadas na Tunísia em 1943 e enviado a um campo de prisioneiros nos Estados Unidos.
Depois do fim da guerra, os prisioneiros seriam repatriados a seus lugares de origem, e esse era o problema de Georg. Ele nasceu em Schweidnitz, Baixa Silésia, por aquele então pertencente a Alemanha, mas agora fazia parte da Polônia e se chamava Świdnica, onde lhe esperava uma Europa em escombros, a miséria e o controle soviético, nada amável com os antigos membros da Wehrmacht. De modo que, decidiu arriscar-se a ficar nos Estados Unidos, que tinha se livrado da devastação da guerra e onde a economia progrediu devido à expansão de sua indústria durante a guerra.
Depois de estudar os horários dos trens de carga que passavam cerca do campo de Deming, Novo México, em 22 de setembro de 1945 ele escapou e conseguiu subir em um trem que o levou à Califórnia. Ali passou os anos seguintes ocultando sua identidade e fazendo bicos, como lenhador, lavador de pratos ou operário da construção civil.
Ele aperfeiçoou seu inglês, para evitar seu sotaque e conseguiu um cartão de Segurança Social, com uma identidade falsa. Desde aquele momento passou a ser Dennis F. Whiles. Logicamente, estava sendo procurado, mas nunca chegaram a encontrá-lo.
Com a passagem do tempo foi diminuindo a intensidade da busca, até que em 1963 o FBI relegou seu arquivo quase ao esquecimento total, pois não era alguém perigoso e inclusive entendiam suas motivações para não querer regressar.
O agora Dennis mudou de cidade várias vezes até que finalmente se estabeleceu em Norden, Califórnia, onde trabalhou como instrutor de esqui no inverno e em trabalhos de construção civil durante o verão. Foi ali que ele conheceu Jean Clarke, com a qual se casou em 1964, e adotou os dois filhos que ela tinha de um casamento anterior. Era um homem novo, com uma nova vida.
A família acabou se mudando para Boulder, no Colorado, onde Dennis se converteu em um membro importante e ativo da comunidade. Ainda assim, sempre existia o temor de que um dia seu passado batesse à sua porta e jogasse por terra toda sua vida. Sentia a necessidade de contar tudo, sobretudo a sua esposa, para quem tinha mentido dizendo que tinha escapado de um orfanato quando era criança.
Em 1984, quase 40 anos após seu "desaparecimento", tomou coragem e, esperando seu perdão, contou sua verdadeira história a sua mulher. Jean disse-lhe que devia tornar a história pública. E fez, mas a sua maneira. Dennis entrou em contato com o professor de história Arnold Krammer, autor de um livro sobre os prisioneiros de guerra alemães nos Estados Unidos, para que escrevesse um livro sobre sua história.
No ano seguinte era lançado "O último soldado de Hitler nos Estados Unidos" e, ademais, ele se entregava às autoridades no programa de TV Today Show, tornando-se assim no último prisioneiro de guerra alemão da Segunda Guerra Mundial.
Dennis (Georg) em 2009
E o governo que pensou? Simplesmente não sabia o que fazer. Realmente, não era um imigrante ilegal, já que não entrou ilegalmente nos Estados Unidos, de fato, foi levado pelo governo americano para lá. Ademais, tinha fugido depois do fim da guerra, de modo que também não podia ser julgado como prisioneiro de guerra fugitivo.
Foi dessa forma que decidiram lavar as mãos e deixar a água correr. O FBI anunciou que ele tinha sido retirado de seu arquivo de fugitivos e o Serviço de Imigração confirmou que não seria deportado e que começava a tramitar a sua cidadania como... Dennis F. Whiles, ainda que devido a demora burocrática não a recebeu até 2009.
Dennis continuou morando em Boulder e nesse meio tempo visitou a Alemanha. Enquanto estava lá, Jean pediu o divórcio. Jean podia viver com seu passado, mas não com aquela mentira. Dennis morreu de causas naturais, em janeiro de 2013, em sua casa de Longmont, Colorado. Ele tinha 92 anos.
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Comentários
Que história irada.
Por isso o MDIG é o melhor :clap: :clap: :clap: :clap: :clap: