«Escravos cubanos» deixam médicos brasileiros nervosos

Pepe Mujica.

Todos já devem estar sabendo do papelão aprontado pela classe médica, representada nesta ocasião por um bando de patricinhas imbecis, ontem em Fortaleza na recepção dos 400 médicos cubanos -hostilizados e chamados de "escravos"- que chegam para trabalhar em um dos 701 municípios que não atraíram o interesse de nenhum profissional brasileiro. Algo para lá do vomitável como poderá ver no seguinte vídeo:

O caso é que o corporativismo médico acusa Brasil e Cuba de submeter os médicos ao trabalho escravo, evidenciando que o governo cubano receberá uma parte do pagamento. Só que os próprios voluntários asseguram que os salários que receberão serão bem maiores que em outras missões sanitárias já realizadas, algo em torno de 4 mil reais mensais, o que é muito dinheiro em um país onde o valor da cesta básica familiar ronda os 100 dólares.

O mais absurdo desta história é ver o Conselho Federal de Medicina denunciando que a chegada dos médicos da ilha irá expor a saúde da população a situações de risco. Poucos médicos brasileiros, entretanto, aceitaram trabalhar em povoados e cidadezinhas que nunca viram um profissional de saúde na vida. Seria cômico se não fosse tremendamente absurdo dizer para os doentes dessas regiões que é melhor viver sem cuidados médicos do que ser atendido pelos cubanos.

O Conselho andou até espalhando matérias em jornais de renome para denegrir a formação acadêmica de seus colegas da Escola Latino-Americana de Medicina (ELAM), instituição que ensina gratuitamente milhares de jovens e os devolve formados em medicina às comunidades. No entanto, estes sim são os médicos “pau pra toda obra”, dispostos a morarem nas zonas mais inóspitas, capazes de trabalhar com mínimos recursos, preparados para organizar campanhas preventivas de saúde e muito experimentados no diagnóstico clínico, imprescindíveis em lugares onde não há equipamentos nem laboratórios de ponta.

O confronto das associações de medicina da América Latina com Cuba começou no momento em que as primeiras viram seus interesses corporativos afetados com o envio das primeiras missões de saúde a diferentes países da região. Piorou depois com a criação da ELAM. Em muitos países da região as escolas de medicina dificultam a validação dos títulos de escolas médicas cubanas ou de outras escolas da região cuja formação custa bem menos, pese que pouco a pouco estão tendo que ceder.

O corporativismo médico e a oposição (leia-se direitistas extremistas) acusam também o governo de contratar cooperantes cubanos por razões ideológicas como forma de espalhar o comunismo, mas isto está bem acima de qualquer ideologia política, o que esta gente insensata não enxerga (ou finge) é que o Ministério de Saúde não tem outra opção, seu plano para estender a cobertura de saúde a todo o país requer ao menos de 54.000 médicos. Cuba é a única nação capaz de enviar, em um tempo recorde, um contingente de milhares de profissionais às zonas mais necessitadas. Um luxo que pode se permitir porque conta com quase 80.000 graduados em medicina, um para cada 150 habitantes, a maior taxa do mundo.

Lógico que a medida não irá mudar em quase nada o falido sistema de saúde no país, mergulhado no caos por esse governo medíocre do PT, mas classificar uma atitude louvável de politiqueira é politicagem groseira; é pouco, mas já é um começo. Também, ao que parece, já temos a resposta para a pergunta "Seria a avareza o novo credo da medicina?, já que ontem mostraram que estão pouco preocupados com a saúde da população, senão com a saúde de seus bolsos, com a reserva de mercado e a garantia do status quo.

Também podemos inferir que a "nobre" preocupação da classe de que a população seria exposta a situações de risco com profissionais desqualificados pode ser outra: que em realidade esses médicos demonstrem qualidade, perícia e tratamento humanizado, muito em falta hoje em dia. De qualquer forma, a máscara da igualdade e da preocupação com os pobres, relacionada com a nobreza da profissão, está no chão.

Fonte: Publico.