Beijing 2008, conspiração do silêncio?

Em 8 de agosto milhares de atletas desfilarão ante milhões de pessoas em todo mundo que acompanharão a cerimônia de abertura dos jogos. Nos dias seguintes poderão ser vistos assombrosos nadadores, ginastas impetuosas, jogadores de futebol, tenistas, jogadores de hockey, atletas velozes, resistentes; lançadores, saltadores: os Jogos Olímpicos de Pequim na televisão.

A verdade, independente se os Jogos Olímpicos em Pequim vão ser um sucesso esportivo ou mediático, é que até agora os jogos não ajudaram a melhorar os direitos humanos na China, como prometia Jacques Rogge, presidente do Comitê Olímpico Internacional (COI), senão que contribuíram para ficarem ainda pior.

A pena de morte
Os tribunais chineses seguem condenando milhares de pessoas a morte a cada ano, um número notável das quais são executadas. As pessoas que cometem "crimes" cuja imposição seja a pena capital não recebem julgamentos com as devidas garantias. As execuções aumentaram apesar de que o estado tenha aprovado medidas para tentar preservar a vida de condenados, como por exemplo que os julgamentos, onde haja possibilidade de impor a pena capital, sejam em audiência pública.

Execução de uma Estudante Chinesa - Protesto Estudantil na praça de Tiananmen

No período prévio aos Jogos Olímpicos, as autoridades chinesas não adotaram medida alguma para reduzir o número de delitos pelos quais um cidadão pode ser condenado a morte: sessenta e oito.

Reeducação à força
Longe de atuar como catalisador de reformas, as autoridades chinesas utilizaram a celebração dos Jogos Olímpicos como pretexto para ampliar o uso da detenção administrativa punitiva, em particular a "reeducação pelo trabalho". Em 7 de fevereiro de 2007, o Departamento de Segurança Pública de Pequim anunciou que durante o ano seguinte a polícia ampliaria os períodos de reabilitação forçada de dependentes de droga de seis meses para um ano.

Nesse mesmo ano foram divulgadas notícias da existência de centros secretos de detenção estabelecidos próximo a capital para prender pessoas que cometessem pequenos delitos até que pudessem ser devolvidas pela força policial a suas cidades de origem. Da mesma forma muitas pessoas foram obrigadas a trabalhar nas obras de estádios que serão utilizados nas Olimpíadas a troca de pão e água e na semana passada foram convidadas a sair da capital abaixo de solicitações oficiais em forma de cacetete.

Estádio Olímpico Ninho de Pássaro

Vendedores Ambulantes
Em janeiro de 2008, a polícia de Pequim iniciou uma nova campanha para "erradicar as atividades ilegais na praça de Tiananmen e ao longo da avenida Chang'an no período prévio aos Jogos Olímpicos". Com isso pretendiam mascarar as atividades ilegais que podem "sujar" a imagem da cidade para o ocidente e afetar a ordem social. Os principais objetivos eram mendigos, vendedores ambulantes sem licença, distribuidores de folhetos e taxistas ilegais.

Vendedor ambulante

No final de junho de 2008, a polícia de Xangai enviou notificações a ativistas e pessoas que organizam e assinam petições de ordem subvervisa ordenando os a se apresentarem ante a polícia todas as semanas. Na notificação uma advertência de que não deviam falar com estrangeiros, nem visitar Pequim até que terminassem os Jogos Olímpicos.

Após o terremoto que assolou a província de Sichuan, as autoridades locais da capital da província, Chengdu, solicitaram às escolas a "estabelecer planos efetivos para garantir a estabilidade" e pediram vigilância durante as 24 horas do dia para "impedir absolutamente que as pessoas que já tenham se envolvido em atos subversivos viajem para Pequim".

Também pretendem "limpar" os ativistas e defensores de direitos humanos para que não possam protestar. Categorias de delitos definidas no Código Penal em termos amplos, como "separatismo", "subversão", "alteração da ordem pública", "pôr em perigo a segurança do Estado" e "filtrar segredos de Estado", seguem sendo utilizando para processar e condenar a morte pessoas dedicadas a atividades legítimas e pacíficas em defesa dos direitos humanos.

Censura Geral
Apesar da introdução de novas normas sobre os meios de comunicação, que aumentam a liberdade dos jornalistas estrangeiros para cobrir notícias na China, estes seguem denunciando obstruções para conseguir fazer uma simples entrevista. O Clube de Correspondentes Estrangeiros da China documentou aproximadamente 180 casos em 2007. Até o mês passado (julho de 2008), este número já tinha chegado aos 230, incluídos mais de 40 casos relacionados aos distúrbios de março no Tibet e mais de 12, após o terremoto de Sichuan em maio.

Censura Chinesa na internet
Os controles sobre Internet também tornam-se mais restritos à medida que nos aproximamos da data dos Jogos Olímpicos, e o controle e a censura estenderam-se a diversas categorias de usuários de Internet, como provedores de serviços de Internet (ISP), autores de blogs e proprietários de sites. Vários portais foram fechados por proporcionar informação que as autoridades consideraram delicada.

Cyber sendo vistoriado

Os direitos dos visitantes também são restritos. Em dois de junho de 2008, o Comitê Organizador de Pequim para os Jogos Olímpicos publicou algumas diretrizes que violam o direito à liberdade de expressão e associação das pessoas estrangeiras. As normas afirmam que estas não devem "pôr em perigo a segurança do Estado, nem menosprezar os direitos e os interesses da sociedade e nem alterar a estabilidade social".

Os visitantes estrangeiros são ainda advertidos de que não devem introduzir na China nenhum material (material impresso, DVD, etc.) que "prejudique a política, a economia, a cultura ou a moralidade da China", nem tentem levar do país materiais cujo conteúdo "implique segredos de Estado".

O papel do Brasil e do COI
Os dirigentes mundiais, começando pelo presidente do nosso país, devem alçar publicamente a voz em favor dos direitos humanos na China e apoiar aos ativistas individuais daquele país. Se não o fizerem, passarão a mensagem de que é aceitável que um governo seja anfitrião dos Jogos Olímpicos numa atmosfera de repressão e perseguição.

O COI, por sua vez, deve utilizar sua influência com as autoridades chinesas para que tomem medidas urgentes para melhorar a situação dos direitos humanos e intervir a favor dos visitantes durante os Jogos Olímpicos, para que não percam suas liberdades básicas.

É bom ficarmos atentos. Quando numa madrugada vermos atletas romperem marcas mundiais ou pouquíssimos atletas brasileiros conquistarem medalhas, é bom pensarmos que em meio ao hino, às flores ou ao esforço individual, existe um lado escuro dos Jogos que as autoridades chinesas fazem o possível para impedir que todos saibam.

Não se resigne, não seja parte desta "conspiração do silêncio".


Resta nos torcer para que a TV Globo se esforce para mostrar esta realidade obscura dos jogos, tanto o quanto está fazendo para recuperar os pontos do Ibope perdidos pela tosca e popularescamente idiota história de Flora e Donatela.