Ocorreu em 2 de fevereiro de 1982. Um guarda da Polícia Florestal, que fazia sua ronda pós-invernal no lado mais selvagem do Alasca, bem perto do rio Coleen, achou que divisara uma barraca de campanha ao longe com seu binóculo. Quando se aproximou, ali dentro encontrou o corpo de um homem junto a um diário, que narrava de maneira muito detalhada uma viagem com destino à morte. O guarda que achou o corpo abriu o judiado bloco de anotações na primeira página e depois de uma primeira olhada, tudo começou a fazer sentido. |
Rio Coolen no verão. Via: Wikimedia Commons
Ocorreu em Brooks, uma região que se estende do oeste ao leste, ao longo do norte do Alasca, até o território de Yukon, no Canadá. As paisagens da região são tremendamente belas e inexploradas, um convite à exploração a todo aventureiro, mas tem um problema: se alguém se afastar muito das trilhas indicadas nos mapas recomendados da área, então encontra outro Alasca, um bem desconhecido e perigoso. Foi mais ou menos isso o que aconteceu a um fotógrafo no começo da década de 80. Esta foi sua (triste) história.
O soldado fotógrafo
Via: Wikimedia Commons
Carl McCunn nasceu em 1946 na Alemanha, mas seu passaporte era americano, pois seu pai Donovan McCunn servia no exército dos Estados Unidos em uma base alemã. Pouco depois voltaram a San Antonio, Texas, onde Carl passou sua infância. O garoto se formou no segundo grau em 1964 e se alistou na Marinha dos Estados Unidos depois de abandonar a universidade.
Carl serviu durante quatro anos, até 1969. Morou brevemente em Seattle, Washington, antes de estabelecer-se em Anchorage, Alasca, em 1970. Ali viveu vários meses na desolada Cordilheira de Brooks. Ele gostou tanto desta última experiência que pensou em repeti-la no futuro.
Assim foi que em março de 1981 voou ao vale quando o inverno terminava. Já conhecia a região e agora era um fotógrafo de natureza. Sua ideia era registrar a beleza da tundra do Alasca. Em sua bagagem carregava 500 rolos de filme, equipamentos de fotografia, dois rifles, uma escopeta e víveres. Queria permanecer até meados de agosto, uns cinco meses.
A negligência no planejamento
Cordilheira Brooks. Via: Wikimedia Commons
Alguns dias antes, Carl havia contratado um piloto que trabalhava na área para levá-lo até Brooks, cujas montanhas se estendem por uma imensa área com uma distância de mais de mil quilômetros. As montanhas atingem até mais de 2.700 metros de altitude e os geólogos afirmam que a cordilheira tem aproximadamente 126 milhões de anos.
No entanto, e enquanto Carl via o avião se afastar da região inóspita do Alasca que escolhera, o fotógrafo se deu conta de uma "leve" besteira que acabara de cometer: não havia contratado a viagem de volta. E mais, não tinha dito a seus amigos o ponto ou a região onde tinha pensado trabalhar. Ele achava que sim, mas jamais o fez.
Em suas primeiras anotações do diário escreveu sobre o regresso dos animais às áreas de verão:
- "Os seres humanos estão tão fora de seu elemento moderno em um lugar como este". No início de agosto, com seus itens básicos de sobrevivência diminuindo, sua preocupação começou a aumentar:
- "Acho que deveria ter organizado melhor minha aventura", escreveu. - "Agora nem me lembro direito se contratei a viagem de volta, logo averiguarei".
A esperança de que a família viesse ao seu resgate
Via: Wikimedia Commons
Em meados de agosto, suas entradas no diário já não estavam datadas. Carl deu-se conta de que o piloto não ia regressar. Neste ponto, tentou fazer com que suas provisões durassem mais; passava grande parte de seu tempo buscando comida, matando alguns patos e coelhos ou fazendo carne seca de uma rena que morreu no lago. Sua ansiedade crescia cada dia mais e mais.
No diário de Carl era possível perceber sua esperança de que sua família ou amigos enviassem alguém para buscá-lo após seu sumiço. O homem cria ter deixado três mapas com sua área de acampamento marcado para alguns amigos e seu pai, mas era uma lembrança vazia e, em tal caso, não tinha claro o itinerário exato que indicou.
A verdade é que, ainda que seu pai soubesse que estaria no local, não sabia quando planejava voltar. Carl também tinha dito ao pai que não ficasse preocupado se ele não voltasse no final do verão, já que pensava na possibilidade de ficar mais tempo se as coisas dessem certo como esperava.
Enquanto isso, seus amigos, preocupados, pediram a guarda do Alasca que iniciassem os trabalhos de busca. Assim foi como aconteceu o segundo momento mais triste da viagem de Carl McCunn. Um piloto voou sobre o acampamento e o viu. No entanto, posteriormente declarou que ele não mostrava sinais de desespero e que este estava agitando uma bolsa vermelha.
- "Fizemos a volta para assegurar-nos, e o homem saudou-nos de maneira casual, nos viu passar sem fazer sinal nenhum de estar em apuros".
O desconhecimento de regras de sobrevivência
Cordilheira Brooks. Via: Wikimedia Commons
A polícia declarou mais tarde que não via nenhuma razão para supor que Carl precisasse de ajuda. Por sua vez o fotógrafo escreveu mais tarde em seu diário:
- "Lembro de estar levantando minha mão direita, ombro alto e sacudindo meu punho na segunda passagem do avião. Recordo que esbocei um sorriso, foi um momento de alegria, como quando sua equipe faz um touchdown ou algo assim".
No entanto, esse é justamente o sinal de montanhistas para indicar que tudo está bem. Um soldado do estado, que falou com Carl antes de sua viagem e tinha ajudado a marcar seu acampamento em um mapa, declarou que o fotógrafo estava mais ou menos perto de uma cabana de caça no local. Não está claro por que ele não foi até ela quando o clima começou a congelar. Com a chegada do inverno ele escreveu o seguinte:
- "Não consigo crer. Agora já passou muito tempo. Chegou a neve e o lago congelou. Vi o primeiro lobo, como um husky gigante. Dei um tiro nele e ouvi seus uivos, mas acho que não acertei".
O começo do fim... o pedido de perdão e a rendição
A caça foi ficando cada vez mais escassa, e Carl montava armadilhas para coelhos, mas as mesmas eram atacadas por lobos e raposas:
- "Foi um dia terrível para mim e não vou poder seguir assim. Tenho as mãos cada vez mais congeladas. Só me restam feijões. Honestamente, tenho medo por minha vida. Mas não me renderei".
No mês de novembro, estava totalmente sem provisões. Então considerou tentar caminhar até Forte Yukon, a aproximadamente 90 quilômetros de distância, mas não conseguiu fazer a caminhada devido a neve e a sua debilitada condição. Durante o Dia de Ação de Graças, 26 de novembro, e mais fraco do que nunca, escreveu:
- "Sinto-me miserável. Tive calafrios de manhã ao acordar durante os últimos três dias. Não posso durar bem mais que isto. Não posso deixar de pensar em usar uma bala".
Pouco depois escreveu uma carta a seu pai dizendo como fazer um possível filme sobre sua aventura. Com o pouco que tinha acendeu a última fogueira e escreveu:
- "Querido Deus no céu, por favor, perdoe minha debilidade e meus pecados. Por favor, cuide de minha família. Estou queimando o último raio de luz e minha última madeira rachada. Quando as cinzas se esfriarem, vou me esquentar com elas".
Acrescentou uma nota separada pedindo que seus pertences pessoais fossem devolvidos a seu pai, e disse que a pessoa que o encontrasse deveria guardar seu rifle e escopeta. Assinou a declaração e anexou sua carteira de motorista do Alasca.
- "A quem me achar. Este sou eu", escreveu e concluiu sua última entrada na centésima página do diário: - "Dizem que não dói!"
Após isso, Carl McCunn apertou o gatilho contra a própria cabeça. Foram as últimas palavras de sua última e fatídica viagem ao Alasca. Ele tinha apenas 35 anos de idade
Fonte: NYTimes.
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