Ontem, logo após publicar a história da foto infame que mostra Sophia Loren olhando de soslaio para o enorme decote de Jayne Mansfield, o amigo Jackson sugeriu nos comentários que contassem a outra história pela qual Jayne ficou marcada. Há exatos 53 anos morria de forma sinistra a sex symbol mais escandalosa dos anos dourados e a que se atreveu a desafiar o mito de "loira burra" ao se fazer passar por uma. |
Noite de 29 de junho de 67. Uma família faz o trajeto de carro entre Biloxi, Mississipi, e Nova Orleans. No assento dianteiro vão o motorista, Jayne Mansfield, a atriz de Hollywood, e seu último parceiro e advogado Sam Brody. No traseiro dormem três dos filhos de um casamento anterior da atriz.
Ao mesmo tempo, a muitos quilômetros dali, um obscuro personagem conhecido como Anton LaVey, autoproclamado Papa Negro, recorta com uma tesoura uma foto dele mesmo em uma revista. Ao virar o recorte vê que em parte traseira tinha uma foto de Jayne Mansfield, à qual ele cortou a cabeça sem se dar conta.
Enquanto isso, já de madrugada, a família continua sua viagem. Todos os passageiros menos o motorista dormem e um intenso nevoeiro começa a invadir a estrada. De repente, aparece um caminhão parado ante eles e o motorista não tem tempo de esquivar. O choque é frontal, os três adultos morrem no ato e da violência do golpe Jayne Mansfield é decapitada.
Este terrível relato é uma presença fixa nas compilações de maldições de Hollywood, mistérios e escândalos das celebridades e enigmas da meca do cinema. Como costuma ocorrer, é muito "bom" para ser verdade. A história do brutal acidente é verdadeira, mas não o é que Jayne Mansfield perdeu a cabeça. Já a intervenção acidental ou não de Anton LaVey fica à credulidade de cada qual. O que ocorreu foi que ela usava uma peruca que caiu de sua cabeça e as fotografias do acidente com a peruca no chão deram margem a rumores truculentos.
Rumores que foram suficientes para que o cineasta Kenneth Anger os incluísse no infame "Hollywood Babilonia". Escrito e impresso como uma das bíblias da fofoca, quanto mais mal-intencionado melhor, já pouco importava que a azarada Jayne morresse em circunstâncias terríveis por si só; para o mundo, seu corpo foi mutilado, e todos sabemos que ante uma lenda bastante poderosa, a verdade tem pouco que fazer. Hoje, o que mais se recorda da vida de Jayne Mansfield é, precisamente, sua morte.
Jayne ao natural.
Isso parece injusto, mas tem lógica. Ainda que ótima atriz, Jayne nunca foi uma estrela de primeiro nível senão uma das starlettes surgidas na sombra do sucesso de Marilyn Monroe, como Diana Dors ou Mamie Van Doren, empregadas pelos estúdios como concorrência e imitação da loira mais famosa do cinema.
Em grande parte, foi ela mesma que decidiu que fosse assim. Quando Marilyn começou a despontar no princípios dos 50, a jovem Jayne viu a oportunidade e a inspiração para se tornar atriz, tingiu o cabelo de loiro platinado e convenceu seu primeiro marido, do qual tinha tomado o sobrenome, para morar em Hollywood com sua primeira filha a reboque. Contava com vários fatores inevitáveis sobre os quais cimentar uma carreira: beleza inegável, ambição a prova de bombas e grandes e proeminentes seios.
Como explicou Karine Longworth em seu podcast "You must remember this", Jayne, uma mulher muito inteligente, QI de 163, que falava cinco idiomas, pensou que poderia fingir de forma consciente que era uma "loira burra", dar aos estúdios e ao público de Hollywood o que queriam, explorar como estereotipo a consciência, ganhar e sair indene. Conseguiu (mais ou menos). Ela é considerada uma das principais símbolos sexuais da década de 1950.
Jayne foi uma dessas pioneiras a explorar sua própria imagem por ser muito consciente de que seu físico era uma rentável ferramenta de marketing. Pelo efetivo método de ir a todas as festas, se colocar sobre todos os holofotes e realizar manobras publicitárias do estilo de deixar cair a parte de cima do biquíni em uma piscina durante um ato de imprensa, conseguiu começar a ficar conhecida, sair de forma habitual na Playboy e protagonizar várias comédias de relativo sucesso.
Se Marilyn era a bomba sexual por excelência, com Jayne tudo era levado ao extremo da paródia. A curvilínea atriz era uma espécie de desenho animado andante, um furacão, mas sem a tristeza desvalida e as possibilidades dramáticas de Marilyn.
Jayne e Mickey.
E em sua vida cotidiana atuava como tal: sua relação com o fisiculturista Mickey Hargitay respondia à definição de "casal perfeito", e era um alarde de coerência e visão de si mesma como um produto.
Jayne e a filha Mariska.
Em 57 se mudou para uma mansão que batizou como o Palácio Rosa. A moradia era uma fantasia pintada de rosa que teria feito as delícias de uma menina de quatro anos ou uma Barbie de qualquer idade: piscina em forma de coração com a frase "I Love You, Jayne" gravada no fundo, carpete de esconder o pé por todas partes, piano branco, paredes acolchoadas forradas de couro vermelho, peles de ursos polares e cantos dedicados a expor as numerosas capas de revistas que Jayne ia acumulando. Nessa casa foram criados os filhos do casal, incluída Mariska Hargitay, a hoje estrela de Lei e Ordem.
Jayne parecia a encarnação do sonho americano, trivial e de ouropel, sim, mas real afinal de contas. Até que os problemas começaram a chegar. O casamento com Hargitay acabou, e Jayne começou a encadear relações cada vez mais insanas até acabar com homens que a maltratavam e se aproveitavam de seu dinheiro.
Tudo isso agravado com o fato que os estúdios deixaram de lhe oferecer trabalho. É possível fazer parte de uma piada coletiva porque vai conseguir um bom benefício, mas quando a piada deixa de ter graça ou foi contada muitas vezes, o mundo perde interesse por você. Não é que o erotismo como objeto de consumo para os homens saíram de moda, mas agora já usava um envoltório diferente, um que Jayne não soube se adaptar.
A prova do louco rumo de Hollywood dos 60 foi a presença de Anton LaVey, uma espécie de mago, bruxo, estrela mediática e principal impulsor da Igreja de Satã nos Estados Unidos. Escritor da bíblia satânica, sua filosofia de materialismo e apego aos prazeres terrenos, enfeitada com espiritualidade new age e abundante parafernália, foi um sucesso em sua época que ainda ressoa hoje, especialmente entre o mundinho do cinema sedento de novidades.
Jayne Mansfield, uma mulher moderna que tinha consumido ácido e experimentado drogas psicodélicas, visitou sua mansão e há fotografias que a retratam participando no que parecem missas negras ou arcanos rituais satanistas.
Aqui, claro, entra em jogo a imaginação, os rumores e os episódios publicitadas pelo próprio LaVey, que não duvidou em anunciar que tinha participado no filme "O Bebê de Rosemary" como assessor satânico, algo falso.
Jayne e o satanista LaVey.
Algumas histórias dizem que a atriz e o satanista tiveram uma aventura que terminou da pior forma, outras que durante uma visita a casa de LaVey, de Jayne e seu último marido, Sam Brody, este decidiu rir de seu anfitrião acendendo velas em teoria sagradas. Isto desatou a raiva de LaVey, que assegurou que Brody acabara de ser amaldiçoado, que acabaria por atingir à própria Jayne.
Sim ocorreu algo dramático que poderia ter tido piores consequências, em que os agoureiros veem uma prova clara da maldição por não se levar a sério o satanismo: durante uma visita a um zoológico, o pequeno Zoltan, filho de Jayne e Mickey Hargitay, foi atacado por um leão. Ainda que foi salvo, teve que se submeter a várias cirurgias para curar as terríveis feridas.
Outras "desgraças", como o roubo de jóias de Jayne ou o que a acusassem de evasão de impostos, soam menos a maldição misteriosa. Claro que o pior estava por chegar: o acidente que custou a vida ao casal e do qual as crianças saíram ilesas.
É uma espécie de amarga ironia que tenhamos bem mais presente Jayne morta que à Jayne viva. Não só as circunstâncias de seu falecimento, que foram "mefistofélicamente" -nunca melhor dito- relacionadas com LaVey contribuem a isto, senão também os comentários de que Jayne tinha o costume de aparecer como fantasma em sua casa, o Palácio Rosa.
Segundo Hollywood.com uma dos proprietários posteriores da casa encontrou uma remessa de roupas íntimas que tinham pertencido à atriz. Sentiu o impulso poderoso de vesti-las, e daí começou uma monomania por colecionar objetos que tinham pertencido a Jayne, até que uma noite escutou uma voz de mulher do inframundo que lhe dizia "Saia daqui!"
O Palácio Rosa também teve habitantes ilustres, como a cantora Cass Elliott do grupo The mamas and the papas ou Ringo Starr, que protagonizou seu próprio minipoltergeist quando tentou pintar o edifício de branco para observar atônito que o rosa original das paredes voltava a surgir entre a tinta branca uma e outra vez, como se a casa se negasse a deixar de ser rosa.
Nos 70, o cantor Engelbert Humperdinck, fã declarado da atriz, dizia com toda naturalidade que sentia o cheiro com frequência de seu perfume nos quartos e até já tinha visto a atriz vestida de preto passeando por seu antigo palácio. Triste ou felizmente, as aparições do fantasma cessaram após a casa ser benzida por um padre em 1980.
O Palácio Rosa foi demolido em 2002 e hoje quase ninguém recorda os filmes de Jayne Mansfield nem a ela para além das circunstâncias macabras de sua morte. Mas deixou-nos um bom punhado de histórias pop para a lembrança, filhas estrelas da televisão, umas tantas fotografias icônicas e que nada mudará o fato de que foi um dos ícones mais conhecidos da cultura americana de celebridades daqueles anos. Nada mau para quem ficou conhecida como "Marylin dos Pobres".
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