'Old enough', o novo programa adquirido pela Netflix que causa polêmica e opiniões divididas

As crianças são os indivíduos mais importantes de qualquer sociedade. Quase todas as culturas que transitaram por este planeta colocaram os pequenos em um lugar sagrado que merece proteção, cuidado e certa devoção. Isto resulta contraditório quando, em países como o Brasil, de 2015 a julho de 2021, quase 20 mil crianças deram entrada em serviços de acolhimento por abandono pelos pais ou responsáveis. De acordo com o artigo 134 do Código Penal, o responsável por abandonar uma criança pode receber uma pena de prisão de 6 meses a 3 anos, mas em casos assim, é difícil encontrar o responsável, porque abandono é crime.

Lamentavelmente, não é necessário cifras para saber que em alguns lugares do mundo os meios urbanos não são espaços seguros para os mais pequenos. Existe um monte de recomendações para os pais sobre todas as precauções que devem tomar quando saem com seus filhos à rua. Talvez por estas experiências, que podem ser compartilhadas ou pessoais, a temática do programa "Old Enough" da Netflix resulta um golpe de realidade para muitos espectadores.

A Netflix recentemente associou-se com a rede de televisão japonesa Nippon para adquirir alguns conteúdos de consumo popular naquele país. Uma destas aquisições foi o programa "Hajimete no Otsukai", que pode ser traduzido ao Português como "Meu primeiro mandado". Este reality, que é transmitido a pouco mais de 10 anos, foi rebatizado pelo serviço de streaming com o título "Old Enough" ("Velho o bastante"), e o formato de visualização mudou de um programa de 3 horas a uma série com capítulos de menos de 20 minutos.

O tema desta nova série chama a atenção porque consiste no rastreamento de crianças menores de 6 anos que fazem pela primeira vez as compra de casa, percorrendo "sozinhos" e sem supervisão ou ajuda parental as ruas de seus bairros. Ainda que dentro da cultura japonesa é costume ensinar os pequenos a cuidar de si mesmos para que sejam suficientemente autônomos desde idades precoces, o público fora da cultura nipônica considerou este programa como uma violação dos direitos das crianças a uma vida livre de violência.

É nesse ponto onde as opiniões se dividem, pois os adeptos ao "empoderamento" dos pequenos consideram que este programa lhes dá confiança e, aos pais, a oportunidade de uma criação menos super protetora. Simultaneamente, asseguram que os delitos contra os menores de idade são menos comuns no Japão, e por isso as ruas representam um espaço seguro para o desenvolvimento de suas atividades.

Pode ser uma boa ou uma má ideia, segundo o contexto do observador. Definitivamente, no continente latino-americano esta forma de criação seria impensável, dada a insegurança das grandes cidades. No entanto, é um excelente cenário ao qual podem aspirar os pais para ajudar seus pequenos a cultivar sua autonomia, sua confiança e o desenvolvimento de sua individualidade.

Por outro lado este é o conceito por trás da forma japonesa de educar os filhos. Mas o que torna isso possível? Estudos mostram que, além da autoconfiança, a confiança na comunidade é bastante alta no país. Então, quando uma mãe manda sua filha para a escola, ela confia que outros passageiros irão ajudá-la caso necessite.

Ela, por sua vez, sabe que pode pedir ajuda a qualquer pessoa e que estará segura ao fazê-lo. Isso é possível porque as taxas de criminalidade no Japão são bastante baixas. As pessoas se orgulham de ajudar uns aos outros, e os filhos se orgulham de serem úteis para a família.