Para boa parte do mundo, ele era conhecido por seu apelido latino Algoritmi que deu origem a palavra "algoritmo". Abu Abdullah Muhammad ibn Musa al-Khawarizmi foi pioneiro em um método de solução de problemas chamados al-Jabr, hoje conhecido como "álgebra". Há mil e duzentos anos, publicou o primeiro atlas do mundo então conhecido, escreveu o primeiro livro de matemática aos 23 anos e estava calculando o movimento de corpos celestes quando os europeus estavam basicamente contando objetos com grãos e pedrinhas ou com tabuinhas com simples marcas. |
O homem que possibilitou a matemática que usamos hoje te o seu legado mais duradouro na introdução aos chamados algarismos arábicos para a maior parte do mundo. Ele não era árabe, era provavelmente Persa. Nascido no que agora é conhecido como Uzbequistão, por volta de 780, Al-Khawarizmi aparece pela primeira vez em registros históricos como instrutor em uma das melhores instituições de aprendizagem islâmica: a Casa da Sabedoria de Bagdá.
A Casa da Sabedoria era na verdade o encontro dos grandes pensadores das civilizações do antigo mundo: babilônica, grega, hindu, árabe e persa. E al-Khawarizmi gostava de molhar o bico no conhecimento que ela tinha a oferecer. Ele estudou a matemática ambiciosa do cientista grego Ptolomeu, por exemplo, que tentou medir o mundo, mas al-Khawarizmi descobriu que os cálculos de Ptolomeu estavam errados, então ele corrigiu e reorganizou todos os dados.
Com novas coordenadas e com a ajuda de cerca de setenta geógrafos sob sua direção, ele compilou um livro chamado "A Face da Terra, uma explicação completa da geografia e da cartografia do mundo então conhecido, que foi o primeiro de seu tipo. Ele também era o oficial astrônomo da corte em Bagdá. E como parte de seus deveres ele compilou gráficos da trajetória da lua e de cinco planetas.
Essas tabelas acabaram por ser tão úteis e precisas que séculos depois seriam traduzidas para latim e chinês e circulariam em todo o mundo. Mas sua verdadeira paixão era pela matemática e ele ansiosamente aceitou uma comissão de líderes mulçumanos para apresentar um explicação textual para o público em geral sobre como fazer cálculos básicos para a aplicações comerciais e de medições.
O resultado foi um texto com o nome inevitável: "Compêndio". Nele al-Khawarizmi explica como resolver equações lineares quadráticas com o que ele chamou de al-Jabr, subtraindo ou dividindo uma quantidade de ambos os lados para encontrar uma incógnita que hoje conhecemos como "x".
Não é que ele inventou a álgebra, embora tenha certamente refinado nossa compreensão dela. Em vez disso, ele codificou o conhecimento de um monte de diferentes tradições, especialmente gregas e indianas para tornar a vida mais fácil para os equivalentes a estudantes de humanas do seu século IX em toda parte.
A este respeito, a sua mais duradoura conquista veio de seu estudo de antigos textos indianos depois de aprender hindi aos 17 anos. Com 25 anos, ele publicou um cálculo hindu com números onde ele descrevia tudo o que aprendeu sobre a matemática. Era um sistema estranho com dígitos de 0, que significava nada, até 9. E usava casas decimais para indicar incrementos de dezenas, de centenas e assim por diante. Em sua época ninguém sabia o que significava os números a não ser os matemáticos indianos.
O livro não vendeu exatamente como água nas livrarias de Bagdá, mas foi um dos mais influentes livros da história, pois trezentos anos depois uma cópia foi descoberta por um monge inglês que, era fascinado pela doutrina acadêmica muçulmana, que traduziu a pesquisa de al-Khawarizmi, agora chamado de Algoritmo, no latim.
Logo na Europa a elite acadêmica estava consumindo-o. O sistema hindu era muito mais fácil e intuitivo do que os numerais romanos, que usa base 10 para contar e base 12 para frações e não tem o conceito de zero. Os homens da ciência começaram a defender o uso do que se tornou conhecido como algarismos arábicos, entre eles o matemático italiano Leonardo Fibonacci, que até escreveu um livro inteiro sobre eles em 1202.
No entanto, a Europa medieval, não estava muito interessada em idéias novas e muito menos sobre o desconhecido sistema posicional com tanta gente sendo queimada nas fogueiras durante a Inquisição. De fato, em 1299, a cidade de Florença, na Itália, aprovou uma lei proibindo o uso dos números, não por algum viés anti-muçulmano, mas porque os números árabes eram muito fáceis de alterar nas anotações.
Qualquer um podia fazer um 3 virar 8 ou colocar alguns zeros depois de um número e obter um grande lucro. Bastava apenas um movimento de pena. Precisamos avançar até 1500 quando os números começaram realmente a fazer sucesso entre comerciantes e estudiosos. Mas naquela época, al-Khawarizmi já tinha sido esquecido pela história, de fato, "matemáticos europeus" tentaram chamar pra si o protagonismo que nunca tiveram .
O polímata sabe-tudo italiano Girolamo Cardano, supostamente versado em medicina, matemática, física, filosofia, religião e música, adjudicou as ideias gerais da teoria das equações algébricas, as mesmas publicadas por al-Khawarizmi 700 anos antes. Confirmando o axioma de "quem sabe tudo não sabe nada" Girolamo "batia cabeça" para entender o conceito do "zero" como número, sem o qual é complicado encontrar soluções para equações de terceiro e quarto grau.
Apesar de que logo provaram ser muito úteis para serem ignorados, as controvérsias sobre o zero e os números negativos continuaram por muito tempo. Acreditem ou não, os números negativos foram considerados um absurdo até a entrada do século 19.
É por isso que nós ainda chamamos os números que o mundo inteiro usa de "algarismos arábicos", apesar do fato de que o cara pelo qual devemos agradecer por eles não era árabe e os próprios números eram hindus. A própria designação "algarismos indo-arábicos" é equivocada, o mais correto seria "algarismos indo-persas", ou mais matematicamente correto ainda como "algarismos hindus", porque al-Khawarizmi "apenas" traduziu a matemática indiana para o mundo, refinando a álgebra no processo.
O problema é que a matemática indiana não tem um criador para chamar de seu, mesmo que alguns livros citem Ariabata como tal. Ainda que ele tenha sido o primeiro dentre os grandes matemáticos-astrônomos da Idade Clássica dos matemáticos e astrônomos hindus, a matemática indiana já existia. Tudo o que sabemos é que a matemática hindu foi inventada entre os séculos I e IV por "matemáticos indianos", sem a citação de nenhum nome.
Muito pouco foi escrito sobre as contribuições matemáticas de outras culturas. Uma razão para a negligência da matemática indiana foi o eurocentrismo. Historiadores coloniais britânicos deram pouca atenção a ela, assumindo que os indianos estavam muito preocupados com questões espirituais para fazer contribuições significativas às ciências exatas. E eles não estavam totalmente errados, porque não há como divergir de matemática de textos hinduístas antigos.
Outra razão é que muitos textos matemáticos indianos antigos estão extintos há muito tempo; frequentemente, a única indicação de que eles existiram vem de estudiosos que se referem ao trabalho de seus predecessores.
Segundo Kim Leslie Plofker, historiadora de matemática, principalmente da matemática hindu, os textos sânscritos sobreviventes revelam uma rica tradição de descobertas da matemática que duram mais de 2.500 anos. No período védico inicial (1200–600 a.C.), um sistema decimal de números já estava estabelecido na Índia, juntamente com regras para operações aritméticas (ganita) e geometria (rekha-ganita).
Estas foram codificadas em um sistema complexo de cânticos, orações, hinos, maldições, encantos e outros rituais religiosos. Frases enigmáticas chamadas sutras continham regras aritméticas para atividades como construir um templo ou organizar uma sequência de fogueras sacrificiais.
Ariabata só é frequentemente citado como criador da matemática porque ele criou a "cifra de Ariabata", o código alfabético singular que sentou as bases para representação única dos números, de 0 a 9, em todo o mundo, independente do idioma. Em um mundo dividido por cultura, política, religião e raça, é um alívio saber de uma coisa que está acima deles: a matemática.
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