O videoclipe viral "Vestido Vermelho" é um experimento social? Arte performática? WTF?

Antes de pegar fogo, "Game of Thrones" da HBO ressoou profundamente com a moralidade contemporânea, tornando-se o mais digno de meme dos programas, para o bem ou para o mal, on-line. Poucas cenas durante o seriado -talvez nem mesmo o Red Wedding ou o final nauseante- geraram tanta reação visceral quanto a caminhada nua de vergonha de Cersei Lannister no final da 5ª temporada, uma cena ainda mais ressonante por ser baseada em eventos reais.

Em 1483, uma das muitas amantes do rei Eduardo IV, Jane Shore, foi levada pelas ruas de Londres por seu irmão Ricardo III, enquanto uma multidão de pessoas assistia, gritando e envergonhando-a. Ela não estava totalmente nua, mas pelos padrões da época, ela poderia muito bem estar, vestindo nada além de um kirtle, uma túnica fina de linho destinada a ser usada apenas como roupa íntima.

Quais são os padrões de nossos dias? E qual é a punição por violá-los? Sarah Brand parecia estar fazendo essas perguntas quando postou "Vestido Vermelho", um videoclipe que mostra seus talentos menos do que estelares para cantar dentro da igreja North Gate de Oxford, na Inglaterra. Em menos de um mês, o vídeo atraiu bem mais de 700 mil visualizações, algo impressionante para uma "cantora" com quase nenhuma pegada na mídia social ou base de fãs.

- "Leva apenas alguns segundos para perceber que Sarah não tem a voz de um anjo", comenta generosamente Kate Fowler na Newsweek.

Ela é ridiculamente inconsciente, uma herdeira com delírios de grandeza, uma triste vítima da cultura da celebridade, forçando-se a um papel que não se encaixa? Ou ela sabe exatamente o que está fazendo?

Os julgamentos de multidões medievais não têm nada na internet, sugere Sarah. "Red Dress" apresenta o que ela chama de "uma representação cinematográfica e holística do julgamento", que inclui a vergonha da internet em seus cálculos. Dada a quantidade de rancor online e ridículo que seu vídeo provocou, "fez o que se propôs a fazer", disse ela à BBC. E dado que Sarah está atualmente concluindo um mestrado em sociologia na Universidade de Oxford, muitos se perguntam se o projeto é um experimento sociológico para obter crédito. Ela não respondeu.

A caminhada de Jane Shore terminou com anos de prisão. Sarah se ofereceu ao desprezo e ódio das turbas. Ninguém está apontando uma lança para as costas dela. Ela deu cara a tapa e pagou pelo privilégio de ter as pessoas rindo dela e está gostando especialmente de alguns comentários muito, muito espirituosos.

- "Isso é incrível. É como se a versão original desta música não existisse. Apenas a versão karaokê", comenta MediocreFilms.

- "Isso absolutamente tem que ser um experimento social. É impressionante como ela consegue acertar a nota errada todas as vezes.", escreve RedFogWhiteFrost.

- "Sempre que canto no chuveiro, pareço horrível em comparação com o original, mas com essa música sou uma melhoria! Obrigado por me fazer sentir talentoso! <3", avalia Terdle.

- "Ela está realmente acertando todas as notas ... apenas de outras músicas. E ao acaso.", analisa um sarcástico Steven Seagull.

- "Bem, pelo menos ela pode dizer que não usa autotune", ironiza Rachel Hardy.

- "'O que estou fazendo aqui?' Se encaixa perfeitamente nessa música", comenta Jesse Miles.

- "Fiquei com água presa no meu tímpano por mais de 2 semanas, desde as férias à beira-mar. Bem, não mais! Obrigado, Sarah, você fez meu dia", agradece José Rodrigues.

- "Isso tem sido um verdadeiro impulsionador do moral para mim. Nunca pensei que encontraria alguém que cantasse pior do que eu. Obrigado.", agradece também Bob Metcalfe.

- "Ei, isso não é tão ruim. Ah tá, desliguei o volume. Foi mal!", desculpa-se Tyler A.

- "O estilo em que canto a música foi importante porque refletiu a história. Os vocais não parecem se encaixar muito bem, eles parecem fora do lugar e deixam as pessoas desconfortáveis ​​... e o vídeo é um estranho fazendo as coisas de forma diferente e causando desconforto e provocando todo esse julgamento" diz Sarah.

Tudo isso é arte performática voluntária, em certo sentido, embora Sarah tenha mostrado aspirações anteriores nas redes sociais de se tornar uma cantora, e talvez tenha enfrentado ridículo semelhante involuntariamente.

- "Parte do que este projeto trata é o julgamento geral como um tema central". Ela se credita como diretora, produtora, coreógrafa e editora e tomou todas as decisões criativas para o espanto dos atores, equipe e músicos de estúdio. No entanto, escolher aguentar o desafio não o torna menos real, sugere ela.

A vergonha que caiu sobre Jane Shore era em parte misoginia, em parte raiva reprimida pela injustiça dirigida a um odiado melhor. Quando qualquer pessoa pode fingir ser uma celebridade com algumas centenas de dólares para cinematografia e produção de áudio, os limites entre os nossos "superiores" e nós mesmos se tornam turvos.

Quando se espera que as mulheres jovens se tornem marcas, correspondam aos níveis de celebridade on-line para reconhecimento social, autoexpressão ou emprego, os limites entre escolha e compulsão se confundem. Com quem nos identificamos em cenas de vergonha pública? Ela também sabe muito bem que não é uma cantora profissional, ao contrário da ingênua Rebecca Black, cuja "Friday" coleciona hoje 154 milhões de visualizações, com 3,9 milhões de "descurtidas".

Sarah é tímida em seu resumo:

- "O comportamento de julgamento prejudica o mundo e é isso que estou tentando trazer à luz com este projeto." Julgue você mesmo vendo o vídeo que ilustra este artigo, que conta com mais de 4 mil comentários e que marcava mais de 300 mil descurtidas, quase a metade do número de visualizações, antes do contador ser desabilitado. Todo um recorde.