![]() | Há cinco anos, o povoado de Cherán, uma pequena cidade no estado mexicano de Michoacan, fez manchetes internacionais por pegar em armas contra as poderosas gangues de drogas que ameaçavam sua subsistência, também expulsando os políticos e a polícia local no processo. Desde então, Cherán é uma experiência única de autogoverno no México. Não há eleições. Cada bairro elege seus representantes por três anos. A polícia estatal não entra e a promotoria federal só vai quando se trata de um caso muito grave, o que não ocorre quase nunca. |

A história de Cherán começou em 2011. Durante três anos, os moradores assistiram impotentes como madeireiros apoiados por cartéis de drogas devastavam as florestas locais, levando os grandes troncos de árvores e queimando o resto, para preparar o terreno para plantios de abacate e drogas. Eles pediram ao Governo que resolvesse a situação, mas não receberam nenhuma ajuda; os políticos e policiais locais corruptos simplesmente optaram olhar para o outro lado. Sem outras opções, e com os madeireiros se aproximando de uma das principais nascentes de água da cidade, o povo de Cherán decidiu que era hora de lutar pela floresta e seus meios de subsistência.
- "Nós estávamos preocupados", disse Margarita Elvira Romero, uma das conspiradoras do levante histórico, à BBC. - "Se você cortar as árvores, há menos água. Muitas famílias sobrevivem da cultura bovina, e onde eles iriam beber se a principal nascente secasse?"

Ela e algumas outras mulheres primeiramente tentaram razoar com os madeireiros, mas foram agredidas verbalmente e perseguidas por capangas armados? Foi ai que elas tiveram a ideia de bloquear os caminhões madeireiros que tentassem atravessar Cherán, e receberam o apoio de toda a comunidade.
Na sexta-feira 15 de abril de 2011, Margarita e outras bravas mulheres de Cherán, bloquearam os caminhões e mantiveram alguns caminhoneiros reféns. O sino da igreja local começou a tocar e fogos de artifício iluminaram o céu, alertando toda a cidade sobre o perigo iminente. As pessoas corriam pelas ruas carregando facões, paus, foices, pedras e quaisquer outras armas que poderiam ter em suas mãos, esperando que os madeireiros viessem libertar seus amigos. Eles realmente vieram com a polícia local e o prefeito corrupto a tira-colo. Ameaças de um lado, foices e facões brandindo do outro e depois de um longo e tenso impasse, os madeireiros recuaram, pois estavam em menor número.

O levante foi o início de um caminho para a auto-governação de Cherán. Logo depois, os políticos e policiais locais também foram expulsos da cidade por conspirar com os criminosos, e os partidos políticos foram banidos por causar divisões entre as pessoas.
Para substituí-los, a Ronda Comunitária -uma milícia formada por homens e mulheres locais- foi criada, e cada um dos quatro distritos de Cherán elege representantes para a Câmara Municipal. Seus membros são eleitos para um mandato de três anos. Pontos de inspeção com homens e mulheres armados foram criados nas três principais estradas que levam até a cidade, para proteger contra a retaliação por parte dos madeireiros e cartéis de drogas. Eles ainda estão por aí esperando alguma falha na segurança. Por isso, qualquer um que tente entrar ou sair de Cherán é parado e interrogado pela Ronda Comunitária.

Contra todas as probabilidades, a cidade de Cherán conseguiu afastar seus opressores e estabeleceu um Estado de Direito, tudo isso sem a ajuda do governo mexicano. Hoje, os partidos políticos ainda são proibidos e não há polícia. O Grande Conselho e outras comissões criadas pelo povo controlam todos os aspectos da vida na cidade, e a Ronda Comunitária é responsável pela segurança e manutenção da paz.
Em comparação com o resto do estado de Michoacan, a taxa de criminalidade em Cherán caiu consideravelmente. Não houve nenhum assassinato, sequestros ou desaparecimentos registrados na cidade durante o último ano, e as pessoas se sentem seguras em muitos anos andando pelas ruas, mesmo no meio do breu da noite. Enquanto isso, nas comunidades localizadas a não mais de 10 km de distância, assassinatos e sequestros são comuns, e os dados mostram que o crime está em ascensão.

Cherán certamente não está livre do crime, mas as infrações mais registradas são coisas de "ladrões de galinha" ou na maioria das vezes estão relacionadas com o abuso de álcool. Mas, nesses casos, a cidade tem a sua própria justiça, multando, impondo trabalhos voluntários na comunidade ou então sentenciando o infrator a passar algumas noites atrás das grades. A justiça federal só é convocada no caso raro de um crime grave, e faz tempo que não acontecem na cidadezinha.
Mas não é só a cidade que renasceu após a revolta de 2011. A floresta devastada também começou a se curar sob a proteção de seus vizinhos. Estima-se que mais de 17.000 hectares de floresta foram devastados pelo crime organizado antes do povo de Cherán colocar um fim a isso. Desde então, 3.000 hectares foram replantadas com mudas de viveiros locais, e as florestas são patrulhadas diariamente por membros da Ronda Comunitária. Todo mundo que quiser cortar uma árvore tem de obter permissão das autoridades locais, e a lei é rigorosamente aplicada.

Hoje, Cherán é considerada tanto como um exemplo quanto um farol de esperança para muitas comunidades mexicanas atormentado pelo crime e pela corrupção, e alguns até tentaram imitar seu sistema de auto-governo, mas sem o mesmo sucesso. A chave, os moradores dizem que é a unidade. Há poucas pessoas de fora que vivem em Cherán, todo mundo conhece todo mundo, e as famílias são muito próximas.
Com o crime em ascensão em todo o México, os temores de que cartéis de drogas tentem recuperar sua posição de controle em Cherán são procedentes, mas desta vez os moradores estão prontos e armados até os dentes.

- "Mesmo que exista apenas uma pessoa que queira continuar assim defendendo a nossa cidade, todos nós vamos apoiá-la", diz Melissa Fabian de 18 anos. - "Nós todos nos sentimos orgulhosos porque deixamos de ser controlados e fizemos algo que nenhuma das outras comunidades se atreveu a fazer."
Cheran não é completamente independente: ela ainda recebe fundo estaduais e federais. Mas a sua autonomia como uma comunidade é reconhecida e garantida pelo governo mexicano. A proibição de partidos políticos, por sua vez, foi mantida pela justiça, que confirmou seu direito de não participar nas eleições locais, estaduais ou federais.
Fonte: El Pais.
Fotos: Cheran Michoacan.
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