Ao longo da sorridente costa da África, em época de eleição, é comum ouvir o som de bolinhas de gude batendo contra recipientes de metal, uma forma única de escolha democrática na Gâmbia. Neste país da África Ocidental, os votos não são feitos pressionando um botão ou pelo preenchimento de uma cédula, mas pelo lançamento de uma bolinha de gude a favor do partido político preferido. E ainda assim não é brincadeira de criança. A votação com bolinhas começou em 1965 e foi introduzida pelos britânicos em resposta aos níveis incrivelmente baixos de alfabetização no país. |
Apesar dos gritos de oportunistas e candidatos coniventes com a corrupção, o método de cinco décadas continua em uso no país até hoje. A simplicidade do processo permite que uma prática democrática honesta prevaleça e verifique a possibilidade de fraude e corrupção. O sistema de contagem com bolinhas de gude foi o que tirou a cadeira de Yahya Jammeh, ex-presidente da Gâmbia, após seu "reinado" de repressão de 22 anos.
Yahya inicialmente aceitou o pleito, mas depois afirmou não reconhecer o resultado das eleições e se negou a ceder o poder. Entretanto, quando Adama Barrow tomou posse como Presidente da Gâmbia na embaixada do país em Dacar, Yahya anunciou que renunciava formalmente a presidência do seu país. O ex-presidente exilou-se na Guiné-Equatorial e levou consigo mais de 11 milhões de dólares e um avião de carga com carros de luxo e outros bens.
Mas... como funciona a eleição sui generis? A maior parte do processo eleitoral é comum. O país é dividido em zonas chamadas distritos eleitorais, e cada distrito tem seus próprios centros de votação. Os cidadãos estão autorizados a votar apenas a partir de seus círculos eleitorais designados. Um oficial da Comissão Eleitoral Independente preside a assembleia de voto para supervisionar o processo de votação. Cada eleitor é marcado no dedo com tinta para garantir que ninguém vote duas vezes.
As coisas mudam quando se chega à cabine de votação. Em vez de urnas eletrônicas, os gambianos são confrontados com tambores ou recipientes metálicos com um buraco no topo. Colocado sobre uma mesa, cada recipiente é marcado com a cor, o nome e a imagem do partido político que representa. O eleitor joga uma bolinha de gude no recipiente cujo candidato deseja apoiar.
Ao final da votação, inicia-se a contagem no local. É montada uma caixa de contagem que contém uma bandeja quadrada com furos. As bolas de gude são esvaziadas nesses buracos e os números são contados com base na contagem. O processo conseguiu oferecer transparência e construir a confiança dos eleitores com sua abordagem rápida e aberta.
Embora muitos tenham questionado a relevância do método datado no mundo moderno, seu processo invencível e resultados imaculados mantiveram a fé da maioria no sistema de contagem de bolinhas. Desde a derrota de Yahya Jammeh em 2016, o país percorreu um longo caminho em sua jornada democrática com reformas positivas melhorando a situação e boas candidaturas abrindo novas opções para os cidadãos.
O estranho sistema de votação, porém, permaneceu inalterado. A última votação de bolinhas na Gâmbia foi realizada em dezembro de 2021, quando o tilintar do vidro apontou a reeleição de Adama Barrow como presidente.
Na verdade, nem é tão estranho assim. Esse tipo de votação é antigo. Os gregos votavam usando psephos ("seixos" em grego), daí que o ramo da ciência política que abrange o estudo e a análise estatística das eleições seja chamada de psefologia. A palavra "ballot" ("cédula" em inglês) é derivada do francês "ballotte", que significa bola pequena, pois estas foram usadas nas eleições francesas.
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