A Assembleia Geral das Nações Unidas votou em 2 de março para exigir o fim da invasão da Ucrânia pela Rússia e a retirada imediata de todas as tropas. Entre os 193 Estados membros, 141 votaram a favor da moção, cinco contra e 35 se abstiveram. Entre os países africanos, a Eritreia votou contra e 17 países, incluindo o Sudão, a República Centro-Africana e o Mali, abstiveram-se. Embora o resultado tenha sido um claro sinal de alerta para Putin, o voto africano enviou um sinal diferente à comunidade internacional. |
Este resultado está relacionado ao envolvimento da Rússia no setor militar na África. Recentemente, uma série de golpes e conquistas militares ocorreram na África. De janeiro de 2021 a fevereiro de 2022, ocorreram nove golpes ou tomadas militares em todo o mundo.
Entre estes, cinco estavam na África: Mali, Chade, Guiné, Sudão e Burkina Faso. Os golpes foram bem-sucedidos e os regimes permaneceram até agora. Este é o nível mais alto de surtos desde 2000. O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, lamentou o desenvolvimento, chamando-o de "epidemia de golpe de estado".
A Rússia esteve fortemente envolvida no setor militar na África e exerceu uma influência significativa sobre os conflitos no continente. A partir do Sudão, a Rússia expandiu sua rede para o oeste, em países como a República Centro-Africana, Chade, Níger e Mali.
Originalmente, visava obter lucros comerciais por meio de contratos militares, mas Moscou gradualmente acrescentou a intenção política de expandir seus parceiros alinhados. Agora, a Rússia é o maior fornecedor de armas para a África, respondendo por quase metade de todas as armas que chegam ao continente africano.
Além disso, mercenários russos foram identificados em mais de 10 países da África desde 2016. O Kremlin está usando desinformação e mercenários para alimentar a instabilidade na região.
A Wagner, uma empresa privada russa, tem uma ampla gama de negócios militares na República Centro-Africana, Sudão e África Ocidental. No Mali, uma empresa ligada ao Grupo Wagner assinou um contrato de 6 bilhões de francos (50 milhões de reais) em 2021 para mobilizar cerca de 1.000 mercenários. Na República Centro-Africana, Wagner ganhou grande influência e o governo perdeu quase toda a sua capacidade de controlar as decisões da empresa. A Rússia também fornece tecnologia da informação no setor de segurança, como campanhas de desinformação online e controle de informações, para países africanos.
Nas esferas econômica e de investimento, a China tem uma forte presença na África: de 2007 a 2020, os bancos chineses de desenvolvimento forneceram US$ 23 bilhões em financiamento para projetos de infraestrutura na África Subsaariana. Isso é mais que o dobro do valor total emprestado pelos EUA, Alemanha, Japão e França, e maior do que o fornecido pelo Banco Mundial.
A China tem tradicionalmente assumido uma posição de não ingerência nos assuntos políticos de outros países. Isso contrasta fortemente com os países ocidentais, que prestam assistência na condição de compartilhar valores comuns, como o respeito aos direitos humanos e a democracia, e se posicionam duramente contra a deterioração de tais valores uma vez implantados.
Muitos países africanos passaram gradualmente a apreciar a política de não interferência da China. No entanto, como a China se envolveu profundamente nas economias e sociedades de muitos países africanos, sua postura está mudando gradualmente. No passado, a China respeitou as decisões de organizações regionais, como a Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental, com base em seu princípio de "deixar os problemas africanos para a África".
Rússia e China não são os únicos a fortalecer suas relações com a África. O presidente Recep Tayyip Erdogan da Turquia, que sonha com um retorno ao outrora próspero "Império Otomano", visitou mais de 30 países africanos e demonstrou sua vontade de fortalecer as relações com a África.
Os Emirados Árabes Unidos e outros países do Golfo também estão fortalecendo suas relações com a África. Especialistas da ONU revelaram quão profundamente os Emirados Árabes Unidos apóiam financeiramente as atividades dos grupos armados sudaneses na Reunião do Grupo de Especialistas da ONU sobre o Sudão, realizada em fevereiro de 2022.
Enquanto muitos países intensificaram seu envolvimento na África, os países ocidentais, que tradicionalmente estiveram presentes lá, estão perdendo terreno. A França, que há muito goza de grande influência sobre a África francófona, não conseguiu fornecer soluções eficazes para conflitos prolongados e anunciou a retirada de seus militares do Mali em 2021. Logo após seu anúncio, a Rússia iniciou seu envolvimento no Mali e em janeiro 2022, o embaixador francês foi expulso pelas autoridades do Mali.
A ONU enfrenta dificuldades na construção de consenso entre os cinco membros permanentes (países P5) do Conselho de Segurança e não pode desempenhar um papel decisivo na intervenção em conflitos. Organizações regionais, como a União Africana (UA) e a CEDEAO, respondem, como a suspensão da adesão dos países em questão, mas os efeitos são muito limitados para mudar a situação.
Como muitos atores estão profundamente envolvidos na África e alguns deles apóiam tentativas de golpe nos bastidores, torna-se difícil para qualquer país condenar as tomadas de poder forçadas chamando-as explicitamente de "golpes", por medo de piorar as relações com os países em questão e perder relações diplomáticas.
Durante a Guerra Fria, a competição entre o capitalismo e o socialismo permitiu que os países africanos usufruíssem de grandes quantidades de assistência juntando-se a ambos os lados. A Guerra Fria terminou com a vitória do capitalismo, e os valores democráticos do Ocidente tornaram-se um padrão normativo ao qual nenhum país poderia resistir. Enquanto isso, o Ocidente perdeu seus interesses na África, e os países africanos tiveram que "se virar sozinhos".
Os tempos mudaram. Agora, muitos países estão fortalecendo suas relações com a África. Eles veem grandes oportunidades na África, que tem 100 cidades com mais de 1 milhão de habitantes e perspectiva de maior crescimento populacional. Os países africanos não são mais uma região isolada do resto do mundo. Em vez disso, é hora dos países africanos escolherem seus parceiros como quiserem. As tentativas de golpe tornaram-se uma ferramenta prática que os líderes africanos influentes nas forças armadas e na política sentem que podem usar conforme necessário.
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