Na manhã de 20 de setembro de 2017, o furacão Maria atingiu Porto Rico, atingindo a ilha com rajadas de vento de 270 quilômetros por hora e chuvas torrenciais. Seria o primeiro furacão de categoria 4 a atingir a ilha em quase 85 anos, deixando muitos cidadãos sem necessidades básicas como eletricidade, comida, água encanada e abrigo. No entanto, no rescaldo da tempestade, uma comunidade de moradores saiu praticamente ilesa: cerca de 1.500 macacos-rhesus (Macaca mulatta) que vivem a 1,6 km da costa leste de Porto Rico, na ilha Cayo Santiago. |
A ilha, conhecida localmente como ilha dos macacos, tornou-se o lar improvável desses habitantes no final da década de 1930, quando o primatologista Clarence Carpenter levou cerca de 450 macacos da Índia para a ilha de 38 acres para estudar seus comportamentos sociais e sexuais.
Por meio dessa pesquisa pioneira inicial, o enclave repleto de árvores acabou se tornando o lar do Centro de Pesquisa de Primatas do Caribe, um centro educacional e de pesquisa que faz parte da Universidade de Porto Rico. Ao longo dos anos, gerações de macacos descenderam dessa colônia original, e hoje esses descendentes vagam livremente pela ilha, brincando em suas praias de areia e explorando sua copa interminável de árvores. Os macacos-rhesus, cada um pesando cerca de 20 quilos e conhecidos por suas caudas longas e fofas e pelos cor de palha, vivem em grande parte independentes da intervenção humana (menos alimentação).
Depois que o furacão devastou Porto Rico, pesquisadores do centro temiam o pior para os macacos, sem saber se eles sobreviveriam à tempestade. As notícias iniciais diziam que o número de mortos humanos estava pairando em 65 vítimas. No entanto, uma vez que era seguro retornar à ilha, os cientistas ficaram surpresos ao descobrir que os habitantes peludos haviam perseverado.
- "Dois dias após a tempestade, membros de nossa equipe pegaram um barco para a ilha para alimentá-los", conta Alyssa Arre, diretora científica do centro. - "Todo mundo temia que os macacos tivessem morrido, mas esse não foi o caso."
Alyssa diz que é impossível dizer com certeza se algum dos macacos sucumbiu à tempestade, mas os funcionários encarregados de fazer o censo diário da população não encontraram nenhuma irregularidade.
Embora não existam câmeras na ilha para capturar exatamente como os macacos se comportaram durante a tempestade, Alyssa suspeita que eles buscaram abrigo subindo em uma das duas colinas da ilha e ficando rente ao chão. Os únicos edifícios da ilha são usados pelos funcionários para fins de armazenamento e pesquisa.
- "O furacão destruiu toda a vegetação que os macacos usam para complementar suas dietas", diz Alyssa. - "O vento foi tão forte que derrubou galhos e árvores inteiras, então não achamos que eles subiram nas árvores."
A única intervenção humana diária que os macacos recebem são as alimentações, que surgiram como resultado dos macacos destruírem grande parte da vegetação logo no início de sua chegada à ilha.
- "Originalmente, Clarence e sua equipe] pensaram que os macacos viveriam na ilha sem qualquer intervenção humana, mas os macacos rapidamente destruíram toda a vegetação da ilha e comeram tudo", diz Alyssa. - "Então, eles perceberam que teriam que começar a sustentar a população com provisões de alimentos, e tem sido assim desde o início."
Atualmente, sua dieta inclui coco, milho, sementes, maçã, mamão e uma ração própria para macaco, que são biscoitinhos secos amarelos em forma de ovo. Alyssa confirma que os macacos não são fãs de bananas, apesar do que os filmes e a mídia podem retratar.
- "Eles gostam de pegar a ração de macaco e colocá-la em uma poça e rolar para amolecer antes de comê-la", diz ela.
Como uma instituição de pesquisa que estuda esses mamíferos há décadas, só fazia sentido examinar mais de perto como o trauma, neste caso um desastre natural, afetou seu comportamento e relacionamentos. Os pesquisadores ficaram surpresos com suas descobertas.
- "Depois do furacão Maria, os macacos tiveram mais interações afiliativas em seus agrupamentos, e suas redes sociais se expandiram, então passaram a interagir com mais indivíduos", diz Alyssa. - "Os pesquisadores também estudaram como traumas, especialmente adversidades no início da vida, como um furacão, podem afetar o comportamento e a saúde de um macaco."
Essa pesquisa acabaria se tornando parte de um estudo publicado no início do ano passado na Current Biology, concluindo que os macacos se tornaram mais sociais e aqueles que eram mais isolados antes do furacão aumentaram as conexões sociais depois dele. Outro estudo concluiu que as fêmeas estavam se reproduzindo com menos frequência após o furacão.
Desde a sua criação oficial em 1970, o centro construiu uma reputação como pioneiro no campo da pesquisa de primatas e fez muitas contribuições importantes para nossa compreensão do comportamento humano e dos primatas. O falecido William Windle, que supervisionou o laboratório de fisiologia perinatal do Instituto Nacional de Doenças Neurológicas e Cegueira (NINDB) em San Juan, trabalhou em estreita colaboração com a ilha, pois forneceu recursos para estudos comportamentais e reprodutivos em condições naturalistas.
William estudou os efeitos que a asfixia ou privação de oxigênio pode ter no cérebro de um macaco durante o nascimento, e os danos permanentes ao cérebro que esses efeitos podem gerar. Seu trabalho não apenas mudou os procedimentos de parto em bebês humanos, mas também recebeu o Prêmio Laskerem 1968 por seu trabalho. Mais recentemente, pesquisadores que trabalharam no instituto vêm lançando luz sobre o covid-19 e seus efeitos em macacos.
Um artigo de 1939 publicado na revista Life e fotografado pela fotojornalista alemã Hansel Mieth também colocou a ilha dos macacos no mapa. Uma das imagens de Mieth, conhecida por ser uma das fotos de animais mais icônicas da história, mostra um macaco-rhesus encharcado sentado na água.
Em uma entrevista posterior, Mieth explicou como ela capturou a foto:
- "Uma tarde todos os médicos estavam fora e uma criança veio correndo para mim e disse: 'tem um macaco dentro d'água'... Eu não acho que o macaco gostou de mim, mas ele sentou naquele recife de coral e eu tirei uma dúzia de fotos."
Hoje, a ilha não está aberta ao público em geral, para evitar o contato humano desnecessário com os macacos. No entanto, a cada ano, pesquisadores visitantes vêm à ilha para estudar os macacos e acessar o extenso banco de dados da ilha que contém mais de 60 anos de dados, desde informações demográficas básicas -idade, grupos sociais e taxas de maternidade- de mais de 11.000 macacos à informação genética e uma coleção de mais de 3.300 esqueletos de macacos.
Seus estudos continuam a impulsionar nossa compreensão do comportamento dos primatas e como isso se traduz em nosso próprio comportamento como humanos.
- "Os macacos-Rhesus são um bom modelo para os humanos, pois compartilhamos muitas características de nossa biologia e, da mesma forma, vivemos vidas altamente sociais", diz Alyssa. - "Juntos, os projetos com os macacos-rhesus realizados em Caya Santiago nos ajudam a entender melhor a sociabilidade e a saúde humana e, recentemente, como a adversidade e o trauma podem afetar a vida de um indivíduo."
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