Durante muito tempo, historiadores acreditaram que os antigos egípcios foram as primeiras culturas antigas a marcar a pele. A descoberta de um homem incrustado no gelo glacial dos Alpes em 1991, na fronteira entre a Itália e a Áustria, mais conhecido como Ötzi, com 61 marcas no rosto e no corpo provou que não era esse o caso. A datação por carbono provou que este homem morreu há mais de 5.200 anos, 1.000 anos antes de se acreditar que os egípcios começaram a tatuar seus corpos. |
Em 2018, as tatuagens figurativas mais antigas do mundo foram descobertas em duas múmias do Egito, datadas entre 3351 e 3017 a.C.. Quando arqueólogos descobriram pela primeira vez os restos mumificados em um sítio arqueológico da necrópole de Luxor em Dier el-Bahari de mulheres que tinham tatuagens ao redor do abdômen e das coxas, eles presumiram que essas mulheres eram marcadas como prostitutas devido à falta de homens com marcas semelhantes.
Estudiosos posteriores reexaminaram os padrões e desenhos aparentemente aleatórios e fizeram uma descoberta chocante. Os padrões não eram nada aleatórios e, devido à colocação do símbolo de Bes, deus da fertilidade, ao redor do abdômen e da parte superior das coxas, significava que eles foram obviamente colocados ali para proteger a mulher e seu filho ainda não nascido de perigos.
Acredita-se que essas tatuagens antigas, conhecidas como deq, foram criadas com fuligem misturada ao leite materno e uma agulha presa a um bastão de madeira. Os padrões eram perfurados na pele e depois a tinta era esfregada nas feridas abertas para deixar uma marca permanente.
As origens do deq são desconhecidas. Sabe-se que ele era também praticado na terra de Karda, atual Irã, no terceiro milênio a.C.. Karda era habitada pelo povo de Su, supostamente os ancestrais dos atuais curdos.
No início do século VI, o grego Aécio de Amida escreveu sobre o deq e como ele era preparado, o que publicou em sua obra "Medicae Artis Principes". Neste trabalho, ele explicou que o material deq era preparado triturando e misturando madeira de pinheiro -de preferência sua casca-, algum bronze corroído, goma e óleo de árvores.
Ao lado desta mistura, o bronze corroído também era misturado com vinagre para criar uma segunda mistura. Em seguida, o suco de alho-poró e a água eram misturados. O local da tatuagem era então limpo com esta mistura de suco de alho-poró, um desenho era realizado com uma agulha e a mistura combinada devia ser então colocada na pele.
O geólogo e arqueólogo Jacques de Morgan também observou a tatuagem das mulheres curdas em 1895 e mencionou que as mulheres idosas tinham a maioria das tatuagens e às vezes eram tatuadas por todo o corpo. Quando os homens eram tatuados, era predominantemente nas mãos e raramente no rosto. A mistura, no entanto era menos rebuscada. Fuligem era macerada com leite para formar a tinta que era então transferida para o corpo.
No entanto, a prática do deq tornou-se menos comum devido à influência do islamismo, que proíbe terminantemente a tatuagem permanente, e foi substituída pela henna. Esforços foram feitos para revitalizar o uso do deq como forma de reafirmar a identidade curda, sem sucesso.
Como mostra a o vídeo do canal do Youtube Great Big Story, postado logo abaixo, a turca Fatê Temel é uma das únicas artistas que preserva a antiga arte do deq, inclusive usando tinta tradicional no processo. O motivo simbólico que ela gravou no queixo simboliza o sol e sua busca ao longo da vida por acumular sabedoria e conhecimento por meio das tradições e culturas de sua comunidade.
Em uma entrevista à Al Jazeera, Fatê diz que hoje a tinta tradicional usada no deq varia muito entre as comunidades. A mistura pode incluir ervas verdes, fumo, fuligem e intestinos de animais, mais comumente vesícula biliar de ovelha, junto com leite materno.
Há no entanto uma crendice milenar de que o leite deve ser normalmente retirado de uma mulher que está amamentando uma filha, pois os mais velhos afirmam que a tinta feita a partir do leite materno de uma mãe que amamenta um bebê do sexo masculino não produz uma cor tão vibrante e cicatriza mais lentamente.
De fato, o deq difere muito das concepções modernas de tatuagem. Embora hoje as pessoas muitas vezes façam tatuagens para decoração ou para memorizar eventos, pessoas ou crenças, o deq é tradicionalmente feito para solicitar abundância, proteção, bênçãos ou fertilidade. Algumas mulheres recebem motivos específicos que solicitam proteção contra natimortos durante a gravidez.
A cultura da tatuagem é muito mais antiga do que a linguagem escrita. As tatuagens revelam como a identidade cultural está intimamente ligada ao senso de identidade de uma pessoa e como os indivíduos se relacionam com outros seres -humanos e animais- ou com o meio ambiente.
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