Você já se perguntou por que o japonês gosta tanto de peixe? Desde tempos imemoriais a nação marítima cercada pelo oceano teve muitas oportunidades para pescar, e os registros de consumo de peixes datam de meados do Período Jomon há aproximadamente 4.000 a 5.000 anos atrás. As correntes Oyashio e Kuroshio carregam peixes pequenos para perto das áreas costeiras e atraem bandos de peixes maiores em perseguição, então há uma abundância de áreas de pesca ao longo da costa. Isso permite que peixes encontrados geralmente em águas mais profundas sejam encontrados em águas mais rasas. |
Um desses casos é o bonito (Katsuwonus pelamis), também conhecido como atum-bonito, cujas conservas secas são produzidas e consumidas no Japão desde tempos remotos. Nos primórdios, elas ainda não eram defumadas nem fermentadas por fungos,mas ao longo dos anos, a maneira de preservar este peixe foi evoluindo.
Ainda que a preservação do pescado, por meio de defumação, teve sua origem ligada aos exórdios da civilização, somente no século 15, com a pesca de arenque no Mar do Norte, a defumação alcançou características industriais, com consequente evolução das técnicas utilizadas e o aperfeiçoamento de equipamentos. Da mesma forma, a domesticação completa do dos fungos Aspergillus, só ocorreria a 2.000 anos atrás.
Historicamente, o cultivo de arroz era a principal forma de agricultura do Japão, mas os efeitos das mudanças climáticas levaram à fome e houve um tempo em que o mar era a única fonte de alimento para os japoneses. A partir desse contexto histórico, o povo japonês desenvolveu naturalmente uma cultura de obter alimentos do mar, especialmente porque passaram ser fáceis de conservar com a aplicação da fumigação.
Isto ocorreu durante o Período Muromachi, entre os séculos 14 e 16, quando foi iniciado o método de defumação do katsuobushi. A região de Kumano, localizada na parte sul da Província de Kii, se destacou na produção destes peixes defumados. O katsuobushi de Kumano, chamado de kumanobushi, predominou até o início do Período Edo, em meados dos anos 1800.
Em 1674, a receita de katsuobushi foi introduzida e aprimorada quando substituíram as palhas utilizadas na defumação por lenha de carvalho-japonês e introduziram o método de polvilhamento de fungos kabizuke (Aspergillus glaucus), na província de Tosa.
No início, os katsuobushis eram bastante vulneráveis ao bolor. Para resolver este problema, os bonitos defumados passaram a ser secados de forma mais criteriosa ao Sol além da defumação. E também foi introduzido o método de pulverização de fungos benéficos para neutralizar os maléficos.
Assim, o katsuobushi de Tosa alcançou um elevado nível de qualidade, se tornando um dos principais produtos de exportação da província. O segredo deste katsuobushi foi guardado como segredo de estado, até que um mestre de da província de Kii, resolveu revelar o segredo.
A receita foi melhorada ainda mais um par de vezes com a introdução de uma segunda rodada de polvilhamento de fungos e a retirada da barriga do atum que é muito gordurosa. A partir de então a receita do katsuobushi moderno se espalhou por todo o Japão.
O processo de produção tradicional é um pouco trabalhoso. Depois que o peixe é decapitado, eviscerado e cortado em filés, sem a barriga gordurosa, os filés são cozidos em fogo baixo logo abaixo da fervura por uma hora a uma hora e meia, dependendo do tamanho.
Os ossos das costelas são então removidos e os filés defumados por até um mês usando madeira de carvalho-japonês, litocarpo ou castanopsis. Eles são defumados por cinco a seis horas em uma sessão, deixados para descansar um dia para que a condensação suba à superfície, então SÃO defumados novamente no dia seguinte. Este ciclo de defumação e descanso é repetido de 12 a 15 vezes no total.
Neste ponto, o peixe está seco e duro, e o alcatrão acumulado da fumaça e o excesso de gordura são limpos da superfície. Nesta fase, os filés são chamados de arabushi e são mais comumente encontrados em lojas raspados e embalados para venda sob o nome de katsuo-kezuri-bushi. Eles são mais baratos, mas não são verdadeiros katsuobushi sem o último estágio de fermentação, ainda assim são valorizados como um bom substituto.
O último estágio da criação do katsuobushi é permitir que o peixe seque ao sol usando o mofo. Os filés são pulverizados com cultura de kabizuke e deixados por duas semanas em uma sala de cultivo fechada. O mofo fermenta os filés e também extrai qualquer umidade residual. O fungo é continuamente raspado, com mais secagem ao sol aumentando a dureza e a secura até que o filé se assemelhe a um pedaço de madeira, com menos de 20% do seu peso original.
Por definição, apenas os filés que foram tratados dessa maneira podem ser chamados de katsuobushi. Depois de repetir esse processo de crescimento de mofo e secagem ao sol pelo menos duas vezes, o defumado também pode ser chamado de karebushi. Quando batidos levemente, eles soam quase metálicos e, ao contrário de sua aparência externa bege opaca, quando abertos, eles são de uma cor rubi profunda translúcida por dentro.
Mas então... como se prepara este "pedaço de pau"? Tradicionalmente, pedaços de katsuobushi eram raspados conforme necessário com um instrumento semelhante a uma plaina de madeira chamado katsuobushi kezuriki. Hoje em dia, o defumado é normalmente vendido em sacos de pequenas lascas marrom-rosadas, que variam em espessura: lascas menores e mais finas são usadas como condimento e cobertura para muitos pratos japoneses, enquanto as maiores e mais grossas são preferidas para fazer o amplamente utilizado caldo dashi.
O dashi é rico em ácido inosínico, amplamente utilizado como intensificador de sabor em cubos de caldo, e pode ser classificado em 2 tipos: ichiban dashi (o primeiro caldo) e niban dashi (o segundo caldo). O primeiro possui um aroma forte e sofisticado, enquanto que o segundo caldo é rico em umami. Há também quem goste de cortar uma lasca de katsuobushi, ficar chupando e mastigando como chiclete por horas até que amoleça.
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