Um conto de Natal - 2

Ha ha ha. O senhor Alfons, ria que se acabava. Todos estranhavam que um condenado a morte risse daquela maneira. Ninguém sabia o porque das gargalhadas que saíam da cela de maior segurança do país. Ha ha ha... só o senhor Alfons.

Em sua cabeça ressoava a sentença. De acordo às leis de nosso país e como conseqüência de seus atos atrozes foi condenado a morrer na forca. Nada de engraçado, mas o riso continuava.

Os jornais com manchetes de primeira página anunciavam o seu próximo fim. Pena de morte pelo assassinato de 10 negros. E Alfons: Ha ha ha.

Alfons tinha previsto tudo. Cria fervorosamente na reencarnação, fez todos os rituais prescritos, pegou um pedaço de pele de uma de suas vítimas e sobre ela escreveu com seu próprio sangue, um contrato com o diabo. Ha ha ha.

Viajou a Curitiba e em uma noite sem lua foi a uma misteriosa catacumba do cemitério municipal da qual dizia ser a entrada do inferno e deixou lá envolvida em seda o coração de uma virgem (negra, claro). Ha ha ha.

Buscou nos livros ocultos, a forma com a qual assegurar seu renascimento, cumpriu a cada um dos ritos propostos sem importar com o custo em dinheiro ou em sangue. Tinha muito de um e sempre era fácil conseguir o segundo. Ha ha ha.

Depois, começou sua caçada. O jogo era simples, matava negros, sempre de uma maneira diferente. Esse era seu jogo. Queimou um, apunhalou outro, enforcou o terceiro, tinha muita imaginação. Ha ha ha.

"Quebrou de porrada" o padre que se aproximou de sua cela para confortá-lo por seu próximo fim. Ha ha ha.

Era 24 de dezembro, quase meia noite quando o carrasco ajustou o laço da forca, as poucas testemunhas olhavam a cerimônia com asco, ninguém entendia a causa de suas risadinhas. Abriu-se o alçapão e adeus mister Alfons.

Do feroz aperto de seu pescoço passou a lugar morno e escuro do qual estava sendo expulso. Ha ha ha.

Respirou pela primeira vez em sua nova vida enchendo o pulmões de ar. Ha ha ha.

A enfermeira depois de limpá-lo levou-o ternamente ao lado de sua mãe, abriu os olhos e chorou amargamente, como nunca tinha chorado um recém nascido.

Sua mãe era negra.