Por que os dias nublados nos fazem pensar mais claramente? (ou porque a vida sempre diz «sim» e «não» simultaneamente)

Muito mais do que causar a sensação álgida e gélida, os climas frios e nublados expandem nossa capacidade intelectual. Esta teoria, do professor Adam Alter, pode ser retificada até certo ponto pensando em lugares com climas extremos (Inglaterra, Alemanha, Noruega) e nos de climas "felizes" (África, Bahamas, Brasil). Os primeiros tendem a abrigar pessoas mais "cerebrais" enquanto nos segundos guardam os mais "festeiros".

Pese que possa parecer meio controverso, um clima extremo definitivamente influi sim nas pessoas e inclusive no deus que veneram. De acordo com um estudo publicado na revista PNAS, um clima extremo é sinônimo de um deus moralizador, um deus mais durão. O estudo mostra que a prevalência de sociedades humanas que crêem em deuses moralizadores pode ser predita com um alto nível de exatidão (91%) a partir da data ecológica.

Os climas extremos prestam-se para que as sociedades achem que há algo além que governa sua realidade, algo que intervém em seus assuntos e reforça seu comportamento moral. E é lógico pensar que se você vive em um lugar onde caem muitas tempestades, há ventos fortes ou secas tremendas, tenha a intervenção metafísica mais presente que outros; a natureza torna-se um constante lembrete.

Em seu livro "Drunk Tank Pink: And Other Unexpected Forces That Shape How We Think, Feel, and Behave", Adam Alter explica sua teoria que o tempo ruim nos torna mais cicunspectos e nos convida a pensar mais profundamente, de forma mais clara. E isso funciona pela mão da melancolia, que também expande nossa capacidade criativa. Ele escreve:

- "A luz do sol adormece a mente do risco e do pensamento cuidadoso".

Depois disto ele corrobora sua declaração com um estudo conduzido por psicólogos sociais em Sidney, Austrália, quando os pesquisadores descobriram que em vez de tonificar a mente, o clima bom cancela nossa função cognitiva. Deram-se conta, por exemplo, que em dias nublados as pessoas recordam melhor as "listas de coisas a fazer" do que em dias ensolarados. Recordam bem mais elementos do que em um "belo dia".

Sua teoria é que ao diminuir nosso estado de humor, o clima ruim nos interioriza e nos convida a pensar mais profundamente, mais claramente. Adam escreve:

- "Os humanos estão biologicamente predispostos a se esquivar da tristeza, e respondem a estados de ânimo mais tristes buscando oportunidades para reparar o humor e protegendo-se vigilantemente do que seja que possa estar causando sua tristeza. Em contraste, a felicidade manda um sinal de que tudo está bem, o ambiente não representa uma ameaça iminente, e não há necessidade de pensar profunda e cuidadosamente".

Isto poderia ser uma espécie de consolo. Uma coisa pela outras. Melancolia com lucidez contra alegria com adormecimento mental. Mas há outro detalhe: a insuficiência prolongada de luz natural tem efeitos devastadores em nossos relógios circadianos, que têm um papel crucial em nossas faculdades cognitivas e emocionais.

Na verdade, Adam diz que o horário de verão é uma atrocidade, citando um estudo que descobriu que estudantes, em áreas onde a mudança de horário não é observada, têm um melhor desempenho do que seus pares em áreas que sim. Eu também já falei sobre este assunto no artigo "Melhor não violar o ritmo circadiano ou porque o horário de verão pode ser prejudicial à saúde.

No entanto, talvez onde a ciência e a filosofia mais uma vez convergem, nessas situações paradoxais há que recordar a afirmação de Rilke que "a vida sempre diz sim e não ao mesmo tempo".

Fonte: Brain Pickings.