Tudo começou em julho de 2017, quando o navio de carga MV Aman foi detido no porto egípcio de Adabiya. Ele foi retido porque seu equipamento de segurança e os certificados de classificação estavam expirados. Deveria ter sido fácil de resolver, mas os empreiteiros libaneses do navio não pagaram pelo combustível e os proprietários do MV Aman no Bahrein estavam em dificuldades financeiras. Com o capitão egípcio do navio em terra, um tribunal local declarou Mohammed Aisha, o oficial chefe do navio, o guardião legal do MV Aman. |
Segundo dica do amigo Rusmea, via Facebook, Mohammed, que nasceu no porto sírio mediterrâneo de Tartus, disse que não foi informado do significado do pedido e só descobriu meses depois, quando os outros tripulantes do navio começaram a partir.
Por quatro anos, a vida -e a morte- passaram por Mohammed. Ele observava os navios passando, entrando e saindo do vizinho Canal de Suez. Durante o recente bloqueio causado pelo gigante navio porta-contêineres Ever Given, ele contou dezenas de navios esperando o engarrafamento diminuir.
Ele até viu seu irmão, um marinheiro, passar mais de uma vez. Os irmãos falavam ao telefone, mas estavam muito distantes até para acenar. Em agosto de 2018, ele soube que sua mãe, uma professora responsável por seu excelente inglês, havia morrido. Esse foi o ponto baixo de Mohammed e em dado momento ele considerou seriamente acabar com sua vida.
Em agosto de 2019, Mohammed estava sozinho, exceto por um guarda ocasional e preso em um navio sem diesel e, consequentemente, sem energia. Ele era legalmente obrigado a permanecer a bordo e não era remunerado, estava desmoralizado e se sentindo cada vez mais mal. Ele disse que o navio parecia um túmulo à noite.
- "Você não pode ver nada. Você não pode ouvir nada", disse ele. - "É como se você estivesse em um caixão."
Em março de 2020, uma tempestade tirou o Aman de seu ancoradouro e o navio flutuou cinco 8 km, eventualmente encalhando a algumas centenas de metros da costa. Foi terrível na época, mas Mohammed pensou que era um ato de Deus. Agora ele podia nadar até a praia a cada poucos dias, comprar comida e recarregar seu telefone.
Por mais surpreendente que seja a história de Mohammed, sua experiência não é única. Na verdade, o abandono de marinheiros está aumentando. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho, há mais de 250 casos ativos em todo o mundo em que as tripulações são simplesmente deixadas por conta própria. 85 novos casos foram registrados em 2020, o que é o dobro do ano anterior.
Os proprietários do Aman, Tylos Shipping and Marine Services, disseram que tentaram ajudar Mohammed, mas que estavam de mãos atadas.
- "Eu não posso forçar um juiz a remover a tutela legal. E não consigo encontrar uma única pessoa neste planeta que queira substituí-lo", disse um representante da empresa, acrescentando que Mohammed nunca deveria ter assinado o pedido. Mas como, se ele nem sabia do que se tratava?
Mohamed Arrachedi, da Federação Internacional dos Trabalhadores em Transporte, que assumiu o caso de Mohammed em dezembro, disse que este deve ser um momento para todos na indústria naval refletirem.
- "O caso dele tem que servir para abrir um debate sério para prevenir esses abusos aos marítimos em navios", disse ele. - "Este drama e sofrimento de Mohammed Aisha poderiam ter sido evitados se os proprietários e as partes com responsabilidades e obrigações para com o navio tivessem assumido suas responsabilidades e providenciado sua repatriação mais cedo."
Mohammed Aisha juntou-se ao seu navio "amaldiçoado" em 5 de maio de 2017, e só conseguiu sua liberação no último dia 22, depois de passar quase quatro anos a bordo preso na costa egípcia. Tão logo foi liberado, Mohammed foi levado de volta para a Síria. Então, como ele se sentiu?
- "Alívio. Alegria. Como se finalmente tivesse saído da prisão. Finalmente vou me reencontrar com minha família. Vou vê-los novamente", disse o marinheiro mercante.
Isso marca o fim de uma provação que afetou a saúde física e mental de Mohammed. Afinal, ele estava condenado a uma vida sem energia elétrica, saneamento ou companhia. De fato, ele relatou que se sentiu preso em uma situação que não era sua, encurralado pela lei egípcia e ignorado pelos armadores.
- "Passei meses sem nenhuma comunicação e me senti francamente decepcionado e isolado."
Isso seria o suficiente para qualquer um nunca mais colocar os pés em um navio, mas marinheiros não podem ficar muito tempo longe do mar e ele está determinado.
- "Sou bom em meu trabalho e não quero nada mais do que continuar de onde parou", disse. - "Depois de passar um bom tempo com minha família, lógico", completou.
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Comentários
eu vi essa matéria no jornal e na hora pensei, é matéria pra sair no mdig. parabéns pelo trabalho