É possível que uma larva seja um "superalimento" e que por outro lado arruíne os cultivos e cause perdas econômicas? As duas respostas são positivas e servem para falar de um inseto surgido da incalculável biodiversidade da selva amazônica, que a alta cozinha inclui cada vez mais em seus menus. A larva do besouro broca-do-olho-do-coqueiro (Rhynchophorus palmarum) é conhecida como mojojoy nas comunidades indígenas do departamento colombiano do Amazonas, no extremo sul do país. |
A larva tem outras denominações: no Peru é conhecida como suri; no Equador como chontacuro, mukint ou mukindi; na Colômbia também chamam de chiza, na Venezuela recebe o nome de verme-de-palmeira e na Amazônia brasileira é chamada de bicho-pau.
Para além de seus nomes, que dependem de onde se encontrem, estes insetos em desenvolvimento foram ancestralmente utilizados por essas comunidades amazônicas como parte de sua alimentação, que segundo estudos é rica em proteínas e gorduras, e por suas qualidades medicinais.
Insetos e segurança alimentar
Os indígenas coletam estas larvas das palmeiras de patauá e buriti, principalmente, e comem-nas cruas, fervidas ou assadas. As duas espécies produzem frutos comestíveis ricos em óleo de alta qualidade e muito saborosos. Supostamente, o mojojoy tem o mesmo sabor deles. O patauá e buriti não as únicas, com efeito, há mais de 500 espécies de palmeiras que podem render um bom mojojoy.
A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO, por suas siglas em inglês) define a entomofagia como o consumo de insetos pelos seres humanos e afirma que contribui à segurança alimentar e a combater a fome no mundo.
O organismo internacional propõe que uma das muitas vias para abordar a segurança alimentícia no mundo é através da cria de insetos devido a sua rápida reprodução e suas altas taxas de crescimento, com manejo relativamente barato.
- "São nutritivos, já que contêm níveis elevados de proteínas, gorduras e minerais", explica a FAO.
Como alternativa, ante os danos que possam causar aos cultivos, a FAO diz que podem ser criados aproveitando diversos fluxos de resíduos, sobretudo de alimentos.
Quais são seus benefícios para a saúde?
Na Amazônia são consumidas pelos grupos indígenas ticuna, yagua e miranha na Colômbia. Conquanto os benefícios para a saúde dependem do conteúdo nutricional dos insetos, segundo sua etapa de vida, habitat e dieta, as proteínas e os nutrientes são de "alta qualidade", comparados com os da carne e do pescado.
Ademais, são importantes complementos alimentares para as crianças com desnutrição porque contêm elevados níveis de ácidos graxos e tem um risco reduzido de transmissão de doenças aos humanos. Entre seus componentes também possuem fibra e micronutrientes como cobre, ferro, magnésio, fósforo, manganês, selênio e zinco.
Em sua tese de pós-graduação sobre a caracterização nutricional do mojojoy no departamento de Santander, o colombiano Juan Sebastian Rangel achou que a larva tem 34,69% de proteína; 4,85% de fibra; 17,3% de gordura; 0,11 mg de magnésio, 0,8 mg potássio e 0,94 mg de fósforo.
O mojojoy gourmet
Quando se trata de rastrear esta larva, para além da selva amazônica onde seu consumo também atrai os turistas, podemos chegar até a mesa de restaurantes de alta cozinha na capital colombiana.
É comum ver nas redes sociais imagens e vídeos de quem se atreve provar esse superalimento como parte de sua travessia por áreas desconhecidas nas regiões interioranas da Colômbia, tanto em barraquinhas de rua de venda de comida como em restaurantes especializados.
Em alguns clipes, pessoas comem o mojojoy vivo, não sem antes vacilar um pouco. A recomendação, assim como no consumo do bigato-de-pau-podre, o famoso coró, é que a cabeça deve ser descartada. Quase todos que provam dizem que tem gosto de coco ou do fruto produzido pela palmeira.
Em 2017, quando soldados do Exército Brasileiro faziam um exercício de logística envolvendo militares do Brasil, Peru e da Colômbia, eles aproveitaram para experimentar a larva, mostrado no seguinte vídeo.
Nas redes também abundam registros de restaurantes que oferecem este prato com finas apresentações e como uma comida exótica que se encontra tanto em Letícia, capital do departamento do Amazonas, como em Bogotá.
Mas tem a praga
Besouro broca-do-olho-do-coqueiro (Rhynchophorus palmarum
Apesar de todas as propriedades nutritivas propiciadas pela ingestão da larva, os agricultores exterminam às também conhecidas como chizas -primeiro ínstar larval depois dos ovos-, já que em algumas regiões são consideradas como uma verdadeira praga que causa perdas de colheitas tanto das palmeiras como de outras espécies vegetais.
O primeiro ínstar larval de mojojoy afeta os cultivos de palmeiras depois que os besouros colocam seus ovos no interior dos troncos e as crias se alimentam deles até apodrecê-los. Esta larva subterrânea acaba com as raízes das plantas e pode danificar toda uma colheita de vegetais, tubérculos e verduras. Sua presença implica um incremento nos custos de produção com o uso pesticidas para exterminá-las.
A fêmea põe seus ovos, inclusive em profundidades entre 20 e 40 centímetros, com um período de incubação de um mês. Os primeiros ínstares medem 5 mm ao nascer e passam por três estágios em oito meses até que fiquem da cor branca, com a cabeça na cor marrom escuro, o corpo com forma de "C" e três pares de patas.
Além das palmeiras, afetam a grande variedade de semeaduras como os de batatas, milho, feijão, ervilha, espinafre, alface, tomate, cebola, repolho, entre outros, tanto em solo baixos como acima dos 1.000 metros acima do nível do mar.
A solução é o extermínio?
Entre as maneiras de erradicação usadas pelos produtores se encontram as armadilhas solares, já que os besouro adultos são atraídos pela luz.
As larvas são importantes para os indígenas da região amazônica por seu valor nutricional, que garante sua segurança alimentícia, e suas propriedades medicinais. Por isto, as palmeiras são semeadas para que se desenvolvam nelas, apesar de que depois morram.
Algumas espécies de besouros estão em perigo de extinção por sua erradicação. Como uma opção diferente, os pesquisadores da Universidade Nacional de Colômbia vem estudando formas de criar as larvas sem afetar às plantas de maneira sustentável para as famílias.
Em 2016 fizeram testes de criação de mojojoy em diferentes substratos como a serragem da palmeira de buriti com resultados medianos, afinal as larvas não comem apenas a madeira, senão que também a seiva das árvores.
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Comentários
A alta cozinha pode incluir o quanto quiser. Não troco por um bom corte de picanha/steak/wagyu.