Büsingen, o estranho caso da cidade alemã localizada na Suíça

Ainda que possa soar confuso para algumas pessoas, os fãs de esquisitices geográficas se deleitam com a definição de enclaves, um território ou parte de um território incrustado dentro de outro Estado, como exemplo, o pequeno e belo Lesoto, rodeado pela África do Sul, do qual falamos em um artigo no ano passado. Por outro lado temos o exclave, uma parte de um país que fica separada do restante do território. A localidade de Büsingen am Hochrhein preenche os requisitos de ambas as definições: um enclave dentro da Suíça e um exclave fora da Alemanha.

Büsingen am Hochhrein é uma cidade alemã que é completamente rodeada pelo território suíço, ao norte do Rin e próxima a Zurique. Tem uma extensão de 7,62 quilômetros quadrados, mais ou menos quatro vezes maior que Mônaco.

Desde o princípio do século XIX a pequena cidade ficou separada do resto da Alemanha por uma estreita faixa de uns 700 metros. Por isso a pequena localidade não pertence ao sistema alfandegário da União Européia, senão ao da Suíça, pelo qual desfruta de diferentes leis com respeito a impostos.

Ademais, ainda que em teoria o euro seja a moeda legal, seus cidadãos usam preferencialmente francos suíços. Ali seus cidadão têm leis alemãs e governo alemão, mas uma economia suíça. Mais? Até o final dos anos 80 os estabelecimentos comerciais de Büsingen não aceitavam marcos alemães.

Um tratado assinado em 1967 entre Alemanha e Suíça permite à polícia suíça a operar na localidade, ainda que em número não maior que 10 policiais ao mesmo tempo.

Büsingen conta ademais com dois códigos postais, um suíço e outro alemão, que os cidadãos podem utilizar indistintamente como melhor lhes apeteça. Também podem receber chamadas em seus telefones utilizando o prefixo da Alemanha ou o da Suíça, o que resulta na prática em que cada telefone tem dois números diferentes.

Também possuem sua própria placa para os veículos, criada para simplificar o trabalho dos inspetores de fronteira. E a equipe de futebol local, o FC Büsingen, é a única equipe alemã que joga na liga suíça.

No entanto, toda esta "crise de identidade territorial" não aconteceu por acaso. O problema já começou em 1693, bem antes da primeira unificação da Alemanha,em 1871, em consequência da Guerra Franco-Prussiana. O vilarejo estava sob controle austríaco quando uma briga familiar por lealdade religiosa levou ao sequestro do senhor feudal de Büsingen, que era católico.

Seus primos o levaram para a cidade suíça de Schaffhausen, que era protestante. Ele foi condenado à prisão perpétua e a Áustria passou seis anos ameaçando invadir Schaffhausen para que ele fosse finalmente libertado.

Algumas décadas mais tarde, quando a Áustria decidiu vender suas propriedades locais para o cantão suíço de Zurique, ela manteve Büsingen, puramente por birra, afirmando que Büsingen am Hochhrein jamais pertenceria à Suíça.

Assim, quando parte do Império Austríaco foi absorvido pela Alemanha no final do século 19, Büsingen passou a fazer parte da nova República.

E ainda que os suíços tentaram resolver toda essa bagunça em 1918, quando 96% dos moradores Büsingen votaram para deixar de fazer parte da Alemanha, isso nunca chegou a acontecer. Berlim não quis desistir da cidade, porque a Suíça não ofereceu nada em troca.

Büsingen am Hochhrein não é o único caso de enclave/exclave da Europa, mas é o que tem a história mais curiosa. Campione (foto abaixo) é um município italiano situado às margens do lago Lugano, e rodeado completamente por território do cantão suíço de Tesino. Está separado do resto da Itália por uma faixa de terreno de mais ou menos 1 quilômetro de largura.

Durante a Segunda Guerra Mundial, a Itália não tinha controle sobre o território de Campione, motivo pelo qual os Estados Unidos instalaram ali uma unidade de inteligência, que operou durante toda a guerra graças a que os suíços "se fizeram de suecos", uma expressão espanhola e italiana que faz referência a uma pessoa que tenta se fazer de bobo ou desentendido para que pareça que algo não tem a ver com ele.