Em alguns âmbitos, a sardinha é usada com má conotação para designar a superlotação de veículos de transporte público. De fato, tanto em Portugal quanto aqui no Brasil, a sardinha em lata já foi a metáfora mastigável da pobreza, mas longe estão os tempos onde a sardinha era alimento de terceira. As conservas de sardinha são um ícone cultural em Portugal, que tem uma longa tradição de conserva do pescado. O peixe tem uma história tão longa no país que até tem o seu próprio festival celebrado no mês de junho onde se comem, segundo estimativas 13 sardinhas, por segundo. |
O enlatado em si não se originou em Portugal, foi um padeiro francês Nicolas Appert quem conservou o alimento com sucesso pela primeira vez com este método e se tornou famoso no início do século 19 após apresentar seu invento ao imperador francês Napoleão Bonaparte que estava procurando um novo método de conservação de alimentos para abastecer seu exército.
Napoleão se tornou um grande promotor da conserva, com a principal diferença é que, por aquele então não existia a pequena chave para enrolar a tampa, senão que se abria simplesmente com a baioneta.
No final do século 19, a Bretanha era o líder no mercado internacional das sardinhas em conserva e a França tinha inclusive o monopólio, ainda que logo Espanha e Portugal seguiram seu exemplo e a desbancaram. Em 1918 chegaram a existir em Portugal 223 fábricas de conserva. Uma indústria focada desde sua fundação à exportação.
Se olharmos as atuais latas de conserva, está claro que não têm nada a ver com o que eram antes: o alimento dos pobres e as classes sociais mais baixas. Mas ainda se mantém o preconceito devido ao seu baixíssimo preço. Peça a um amigo para escolher entre o salmão ou a sardinha? Se ele optar pelo primeiro, aconselhe-o a rever seus conceitos.
De acordo com especialistas, a sardinha é uma imensa fonte de saúde. Além de rica em proteína, cálcio e vitamina B12, seu consumo pode auxiliar na prevenção de doenças do coração, e ser essencial para os ossos e a memória. Ademais, pasmem: a sardinha tem mais ômega-3 do que o famoso detentor por excelência de ácidos graxos, o salmão.
O ideal seria dar preferência à forma in natura do peixe-do-povo: assado, cozido ou grelhado, mas as conservas estão longe de ser as vilãs. O grande problema dos enlatados é que há mais sódio e calorias, por isso a forma em lata não deve ser consumida por pessoas que sofrem de pressão alta ou colesterol altos.
A sardinha também me traz boas lembranças da minha infância no interior de Minas: mais ou menos coincidindo com essa época do ano, antes da Semana Santa, chegava o "Caminhão da Sardinha" e as pessoas compravam baciadas do peixe. Passávamos de 2 a 3 dias só comendo sardinha; Diliça!
Hoje, as sardinhas enlatadas de boa qualidade devem ser escamadas, evisceradas e ter a cabeça, as guelras e o rabo removidos antes de serem embaladas. Elas podem ser enlatadas em azeite de oliva, óleo de soja ou em algum tipo de molho.
Portugal tem uma longa tradição na produção de conservas de sardinha. Sua primeira fábrica foi estabelecida no final do século XIX e já durante a primeira metade do século XX, a indústria viveu uma grande expansão, quando se tornou uma grande subsidiária da indústria de guerra. Durante a Segunda Guerra Mundial, Portugal se tornou o primeiro produtor mundial de conservas de sardinha.
As conservas portuguesas são vendidas como um produto gourmet, contra a ideia de que são um alimento de segunda classe. O setor de conservas português soube identificar a necessidade de uma mudança e não têm duvidado em modernizar suas fábricas, procurar novos produtos, transformar sua imagem e apontar para novos nichos de mercado, como o de alta cozinha.
E se por acaso você não sabia, especialistas dizem que as sardinhas em lata atingem seu melhor ponto de consumo anos após a data de validade. Como com os vinhos, existem entusiastas das conservas dispostos a pagar grandes somas por sua degustação. Dizem que segundo o tempo passa sua gordura e a do azeite de oliva se integra ganhando a peça grande melosidade.
Assim como no Brasil, em Portugal a sardinha também é pescada por traineiras ou frota de cerco, uma forma de pesca amiga do ambiente, por não ser agressiva para outras espécies. Após a localização do cardume mediante instrumentos eletrônicos, como o sonar, um bote auxiliar, denominado "panga" é lançado ao mar levando uma das extremidades da rede de pesca. Enquanto o panga permanece fundeado a embarcação principal realiza o cerco (daí o nome) do cardume liberando a rede pela popa.
Com o cerco realizado é iniciado o fechamento do fundo da rede através de um cabo, conhecido como carregadeira, localizado no fundo da rede, que é recolhido pelo guincho de convés. A rede fechada forma uma bolsa, impedindo a fuga do cardume. Conforme a rede é recolhida a bolsa reduz seu tamanho, até o momento adequado para a "despesca".
Uma muito boa notícia para os partidários e defensores das sardinhas: os cientistas da Administração Oceânica e Atmosférica Nacional (NOAA) durante anos observaram e estudaram as sardinhas nos oceanos. Nos últimos anos, eles avaliaram as condições de captura em redes de arraste e realizaram cálculos baseados na quantidade de ovas que encontraram ali. O resultado destas pesquisas mostraram uma espantosa conclusão:
- "O desenvolvimento natural de sardinhas não está em perigo, senão que todo o contrário, a quantidade destes peixes tende a aumentar seu número."
Os cientistas que realizaram a análise dizem que convém diminuir o consumo de atum e bacalhau e encher os pratos com sardinhas e anchovas, se quisermos ajudar a salvar as espécies em perigo de extinção e o equilíbrio de nosso ecossistema.
Nos dois vídeos que finalizam o artigo, o canal do Youtube Insider visitou duas fábricas tradicionais de conservas em Portugal, para mostrar porque as sardinhas em conserva são um manjar no país. Ele visitou a Conserva Pinhais, uma das fábricas de conserva mais antigas de Portugal, que mantém seu método de enlatado artesanal desde 1920, produzindo hoje 30.000 latas por dia.
A segunda peça audiovisual visita a Ramirez & Sons, uma empresa familiar que mantém viva a tradição das conservas há quase 200 anos, apesar de enfrentar a forte queda dos estoques de peixes e uma revolução. O vídeo dá uma grande pisada na bola afirmando de forma incorreta que Portugal tem uma costa mediterrânea.
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