Parece que seria um mundo mais seguro e feliz, certo? Mas a única maneira de realmente saber o que aconteceria seria fazer um experimento em larga escala que pegasse uma grande faixa de habitat relativamente intocado, dividisse em muitas réplicas e removesse os principais predadores de algumas áreas. Felizmente, não precisamos ir tão longe, porque alguém já fez esse experimento acidentalmente. O experimento acidental começou durante os anos 60 e 70, quando o governo venezuelano construiu uma enorme represa hidrelétrica no Rio Caroni. |
A represa acabou dando origem a um lago totalmente novo, que em 1986 havia criado um monte de ilhas totalmente novas de tamanhos variados, cada uma das quais acabou com uma amostragem mais ou menos representativa de espécies locais. Exceto que todos os principais predadores, como onças e gaviões-reais, abandonaram ou morreram nas ilhas menores, porque não tinham território suficiente para caçar.
Os cientistas rapidamente perceberam que a situação era uma configuração experimental incrível; eles podiam observar o que acontecia nessas ilhas -algumas das quais tinham predadores, e outras não- para documentar, em tempo real, o que acontece quando grandes predadores desaparecem de um ecossistema, algo que os cientistas vinham debatendo há anos.
Quando os cientistas verificaram as ilhas em 1994, eles encontraram uma grande confusão acontecendo... literalmente. As populações de macacos bugios em ilhas sem predadores eram até 50 vezes mais densas do que aquelas nas ilhas grandes, que ainda tinham predadores. Os roedores estavam amontoados em ilhas sem predadores em densidades 35 vezes maiores que as encontradas em ilhas com predadores.
As travessuras das formigas-cortadeiras eram ainda mais selvagens, especialmente nas ilhas menores, onde suas populações eram 100 vezes mais densas do que o normal. Mas não foram apenas os animais que foram afetados. Ilhas sem predadores tinham metade da densidade de mudas de árvores das ilhas que ainda tinham predadores.
No ano 2000, ou seja, apenas 16 anos após o início do experimento, as ilhas sem predadores perderam três quartos de suas espécies de plantas; um cientista descreveu uma das ilhas experimentais como - "...uma ilha quase sem árvores enterrada sob um emaranhado impenetrável de cipós."
Mas por que perder as principais espécies predadoras causou essa mudança ecológica gigante? Bem, sem predadores para mantê-los sob controle, as populações de herbívoros explodiram. Algumas dessas criaturas rapidamente comeram seu suprimento típico de alimentos e, quando isso não foi o suficiente, começaram a comer coisas que normalmente deixavam passar; finalmente devorando cada parte da planta que podiam.
Enquanto isso, outros, como formigas-cortadeiras, levaram os restos de plantas tão rápido que não sobrou nada para se decompor no chão da floresta e repor os nutrientes do solo de que as plantas precisam. As poucas espécies resistentes que conseguiam tolerar essas condições ficaram selvagens. Nas palavras dos cientistas, remover os principais predadores desencadeou um "colapso ecológico", conhecido como "cascata trófica" na qual a mudança na população de predadores tem efeitos em toda a cadeia alimentar e ecossistema..
E as ilhas do Lago Guri não são o único exemplo de uma catástrofe sem predadores; colapsos semelhantes aconteceram em lugares que perderam lobos, lontras marinhas e até estrelas-do-mar. Então, no final, acontece que os predadores não estão impedindo essa utopia perfeita; em vez disso, eles são uma grande parte da manutenção dela.
Em muitas partes do oceano, os tubarões são os predadores de ponta. Mas, à medida que as populações de tubarões caem devido à pesca excessiva e às mudanças climáticas, estamos apenas começando a entender como seu desaparecimento pode afetar todos os tipos de ecossistemas marinhos.
O professor da Universidade Internacional da Flórida, Michael Heithaus estudou o papel que os tubarões desempenham nesses ecossistemas e o perigo que seus declínios representam em todo o mundo. Acontece que quando as populações de tubarões diminuem, herbívoros como tartarugas marinhas destroem ervas marinhas superimportantes e florestas de algas marinhas. Michael e seus colegas descobriram que podemos proteger esses predadores importantes criando áreas marinhas protegidas e limitando o uso de equipamentos de pesca conhecidos por prejudicar os tubarões.
Outro exemplo ocorreu quando os lobos foram removidos do oeste americano, a população de alces aumentou de forma desproporcional. O aumento dramático da população de alces não foi acompanhado por qualquer aumento de oferta de comida. Os herbívoros consumiram grandes quantidades de plantas e fungos até que não havia mais comida para sustentá-los e muitos acabaram morrendo de fome, deixando apenas as plantas que não gostavam ou que eram venenosas para eles. A reintrodução de lobos nessas áreas degradadas, rapidamente resolveu a situação.
Mas mudanças na cadeia alimentar não são o problema principal para as populações humanas; os efeitos nos processos do ecossistema são frequentemente mais perigosos. E muitos desses processos são grandes o suficiente para que até mesmo as pessoas em nações industrializadas não consigam se proteger.
As mudanças na vegetação que ocorrem quando a população de herbívoros pode aumentar sem controle podem mudar a frequência e a intensidade dos incêndios florestais. Doenças infecciosas podem se tornar mais comuns; por exemplo, em algumas partes da África onde leões e leopardos se tornaram mais frequentes, populações de babuínos mudaram seus padrões de comportamento, aumentando seus contatos com os humanos próximos. Parasitas intestinais se tornaram mais comuns tanto nos babuínos quanto nas pessoas.
Ademais, há mudanças nas bactérias do solo, disponibilidade de água, biodiversidade e uma série de outras características do ecossistema das quais dependemos para cultivar nossos alimentos, manter nosso ambiente habitável e permanecer saudável.
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