Dizem que se as paredes pudessem falar, cada edifício teria uma história para contar. Poucos contariam tantas histórias tão fascinantes e com tantas vozes diferentes, como Hagia Sophia ou Santa Sofia, um dos locais turísticos mais populares da Turquia, e Patrimônio Mundial da Unesco desde 1985. Situada na encruzilhada de continentes e culturas, ela presenciou grandes mudanças, desde o nome da cidade onde está localizada à sua própria estrutura e destinação. Hoje, os elementos de cada era podem contar suas histórias a qualquer visitante disposto a ouvi-las. |
Antes mesmo de se chegar à Santa Sofia, as antigas fortificações indicam a importância estratégica da cidade, fundada com o nome de Bizâncio por colonizadores gregos em 657 a.C. e rebatizada sucessivamente com os nomes Augusta Antonia, Nova Roma e Constantinopla, ao ser conquistada, reconquistada, destruída e reconstruída por vários governantes gregos, persas e romanos nos séculos seguintes.
Dentro dessas muralhas, a primeira Megale Ekklesia, ou Grande Igreja, foi construída no Século IV. Embora logo destruída pelo fogo durante revoltas, marcou a localização da principal estrutura religiosa da região pelos séculos vindouros. Perto da entrada, as pedras de mármore com relevos são o que restou da segunda igreja.
Construída em 415 d.C., ela foi destruída na Revolta de Nika, em 532, quando uma multidão enfurecida, em uma corrida de bigas, quase destronou o imperador Justiniano I. Tendo penosamente conseguido manter o poder, ele resolveu reconstruir a igreja em uma escala maior e cinco anos depois, o edifício que você vê foi concluído.
Ao entrar nele, as pedras da fundação e as paredes murmuram contos do Egito e da Síria, terras de onde vieram, e colunas trazidas do Templo de Artemisa relembram um passado ainda mais antigo. Inscrições rúnicas feitas pelos vikings da guarda de elite do imperador carregam o saber de distantes terras do norte.
O que chama a atenção é o grande domo, representando o céu. Com mais de 50 metros de altura e mais de 30 metros de diâmetro, circundado por janelas em sua base, o domo dourado parece estar suspenso no céu, com a luz refletindo no seu interior. Sob seu grandioso simbolismo, as robustas colunas coríntias que o reforçam, trazidas do Líbano depois que o domo original foi parcialmente destruído por um terremoto em 558 d.C., lembram silenciosamente sua fragilidade e os conhecimentos de engenharia que tal maravilha exige.
Se uma imagem vale mil palavras, os mosaicos dos vários séculos seguintes têm muito o que dizer não apenas sobre os temas bíblicos, mas também dos imperadores bizantinos que mandaram confeccioná-los frequentemente representados junto com o Cristo.
Junto com suas vozes, altas e nítidas, ouvem-se os ecos assustadores dos mosaicos e ícones danificados e dos que estão faltando, profanados e saqueados durante a Ocupação Latina na Quarta Cruzada. No piso, a inscrição na tumba de Enrico Dandolo, o governante veneziano que comandou a campanha, é uma evidente lembrança dos 57 anos em que a Santa Sofia foi uma igreja católica romana, antes de voltar às suas raízes ortodoxas através da Reconquista Bizantina.
Mas não permaneceu muito tempo como igreja. Enfraquecida pelas cruzadas, Constantinopla caiu sob o domínio otomano em 1453 e, daí em diante, ficaria conhecida como Istambul. Depois de três dias de saque dos seus soldados, o sultão Maomé Segundo entrou no edifício. Embora severamente danificado, sua grandeza impressionou o jovem sultão, que imediatamente o dedicou a Alá, anunciando que ele seria a nova mesquita imperial.
Os quatro minaretes construídos no século seguinte são o símbolo mais óbvio dessa era, trazendo um reforço arquitetônico à sua finalidade religiosa. Há muitos outros. Suportes ornados para velas relatam a conquista da Hungria por Salomão e discos gigantes com caligrafia, suspensos a partir do teto, lembram aos visitantes os quatro primeiros califas que sucederam Maomé.
Embora o edifício ainda pareça uma mesquita, agora é um museu, uma decisão tomada em 1935 por Kemal Ataturk, o primeiro presidente da Turquia, um modernizador, em seguida ao fim do Império Otomano. Foi essa secularização que permitiu a remoção dos tapetes que escondiam as decorações do piso de mármore, e do gesso que cobria os mosaicos cristãos.
O trabalho contínuo de restauração possibilita que a multiplicidade de vozes na longa história da Santa Sofia sejam ouvidas novamente, depois de séculos de silêncio. Contudo, o conflito continua. Mosaicos ocultos emitem lamentos, por baixo de caligrafia islâmica, valiosas peças históricas que não podem ser reveladas sem destruir outras.
Enquanto isso, ressoam brados simultâneos das comunidades muçulmanas e cristãs que pedem o retorno do edifício às suas finalidades religiosas. A história da Divina Sabedoria pode estar longe de terminar. Resta-nos apenas esperar que as muitas vozes que ali se ouvem possam contar suas histórias nos anos vindouros.
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