Seu nome em inglês, "barnacle gooseneck" ("cracas-pescoço-de-ganso"), carrega uma boa curiosidade. Contam que, na Europa medieval, antes do conhecimento preciso de como as aves migravam, acreditava-se que os barnaclas ou gansos-de-rosto-branco (Branta leucopsis), se desenvolviam a partir de crustáceos da classe cirripedia, dado que nunca nidificavam na Europa e guardavam uma ligeira semelhança com os percebes.
Dessa crença originou o nome em língua inglesa desses crustáceos. Os naturalistas medievais acreditavam que, quando os gansos estivessem prontos para eclodir, essas cracas caíam de seus poleiros rochosos e -voilà- gansinhos totalmente formados se erguiam do mar.
Rui Franco, um coletor profissional de mariscos baseado em Ericeira, uma cidade de pescadores e principal destino de surfe na costa oeste de Portugal, explicou que os preços podem variar muito dependendo da qualidade, tamanho e estação. Geralmente, ele vende percebes por cerca de 90 reais o quilo.
- "No entanto, em um bom restaurante de frutos do mar em Madri ou Barcelona, pode custar até 3 mil reais o quilo", diz ele. Eu e mais dois amigos comemos em uma marisqueira em Lisboa e pagamos cerca de 300 reais por uma porção grande o suficiente para dividir.
- "As cracas vivem e crescem na zona intermareal, entre a maré alta e a maré baixa, na área onde há mais ondulação", explicou Rui. - "Quanto mais alta a maré, mais oxigênio há, e elas tendem a se fixar."
Coletores de percebes, em um esforço arriscado, precisam extraí-las das rochas nas áreas com as maiores ondas, na parte da arrebentação, e é aí que mora um grande perigo, pois eles podem ser atirados contra as rochas e ficarem totalmente "arrebentados".
Para piorar a situação, os percebes mais apreciados -mais densos e carnudos- prosperam em locais que geralmente são mais perigosos, que, em geral, é a borda das rochas, onde as ondas estão batendo constantemente contra eles. Isso ocorre porque esses crustáceos precisam se alimentar com mais frequência para que possam crescer e resistir a surra das ondas, e possam se agarrar com mais força às rochas.
Rui é coletor de mariscos desde a década de 1990. Ele detém um dos primeiros números de licença de coleta. Seu número ANI, o número nacional para coletores de mariscos, é 12.
- "Não vou dizer que sou um dos mais velhos, mas em termos de licenciamento nacional, quando a legislação mudou no início dos anos 2000, se não me engano, fui um dos primeiros a processar a papelada", disse ele.
O homem de 49 anos admite que não é um trabalho fácil, então ter garra e determinação é importante. Para Rui, tudo começou com uma paixão pelo mar. Ele pescava desde pequeno na Ericeira; quando jovem adulto, ele mergulhava para pegar peixes, polvos e lingueirões, mas logo os restaurantes de frutos-do-mar começaram a pedir percebes.
- "Acabei me apaixonando pela atividade e, a partir daí, nunca mais larguei, dedicando-me em tempo integral à captura de cracas", disse ele.
A coleta de cracas envolve algumas etapas, algumas delas traiçoeiras às vezes, principalmente sem treinamento adequado. Os coletores mergulham livremente, sem o uso de ar comprimido, mangueiras ou garrafas, e extraem as cracas das rochas usando uma arrilhada, uma ferramenta de metal com uma face frontal cortante e uma lâmina que não ultrapassa cerca de vinte centímetros de comprimento e dois centímetros de largura na ponta cortante.
- "É preciso ter algum conhecimento do mar para dominar a técnica de mover o ilhó [pequeno furo redondo no crustáceo] para tentar capturar as cracas sem danificá-las", explicou Rui. Além da qualidade e do tamanho, o valor de uma craca muda com base na forma como é capturada. - "Se for toda cortada, não vai durar muito e, portanto, não será tão valiosa."
Os mergulhadores se colocam em um determinado ângulo para atacar a rocha, para evitar cortar a parte inferior da craca, para que ela não morra instantaneamente e viva por pelo menos uma semana, quando sempre é mais valiosa.
Os coletores de cracas vivenciam talvez 20 ou 30 dias calmos de verão, mas no resto do ano, especialmente no inverno, eles precisam ter cuidado, pois cair e ser empurrado contra as pedras é um risco aceito do trabalho.
- "Você anda no fio da navalha, você anda na redenção da quebra do mar”, disse Rui, que acrescenta que pescadores experientes levam em consideração condições e elementos específicos, como o clima e a ondulação, ao decidir como abordar (ou não) seu dia.
Para degustar um percebe, o comensal segura a concha, arranca a pele que envolve seu pescoço -ciente de que está sentado em uma zona de respingos- e, se não encontrar um pintinho de ganso lá dentro, o crustáceo recém-cozido no vapor é mergulhado em tigelas de manteiga derretida quente. Diliça!
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