Em 18 de novembro de 1978, Hyacinth Thrash, uma idosa americana que se encontrava na Guiana, o remoto país ao leste da Venezuela, foi dormir na sua cabana. No dia seguinte, quando ela acordou e saiu pela porta, não podia acreditar no que via: mais de 900 cadáveres jaziam ao seu redor. O que ocorreu na noite anterior foi um dos acontecimentos mais horrorosos da história dos Estados Unidos -ainda que não tenha ocorrido em solo americano-. E tudo por causa da crença em um facínora que misturava religião com política. |
. Via: AP
De fato, representou o maior número de baixas civis do país em apenas um evento não natural até os ataques de 11 de setembro. Uma autêntica barbárie, um massacre auto-infligido pelo poder sedutor de apenas uma pessoa, um facínora que misturou religião e ideologia política para acabar com a vida de quase mil pessoas.
O Templo dos Povos
O templo dos povos. Via: AP
Dizia-se que Jim Jones era de origem humilde. O homem nasceu em 31 de maio de 1931 em uma zona rural de Indiana. No início da década de 1950, começou a trabalhar como pastor cristão por sua conta em pequenas igrejas ao redor de Indianápolis. Com o fim de arrecadar dinheiro para começar uma igreja própria, o homem, um tipo carismático e canastrão, experimentou várias táticas, inclusive a venda de macacos de porta em porta.
Jones abriu sua primeira igreja do Templo dos Povos em Indianápolis em meados da década de 1950. Sua congregação integrou-se racialmente, algo incomum naquele momento para uma igreja do meio oeste e este diferencial de abraçar as diferenças contou pontos para ele. Enquanto Jones chamava de "igreja", em realidade era mais a sua versão de uma comunidade marxista, com um punhado de referências cristãs com as quais enfeitava seus sermões. O Templo dos Povos converteu-se em um culto onde era exigido uma séria dedicação (e apoio financeiro) por parte de seus membros.
Em meados da década de 1960, Jones mudou sua pequena congregação ao norte da Califórnia, estabelecendo-se primeiro em Jen Redwood Valley no condado de Mendocino. À medida que o Templo dos Povos cresceu, Jones passou da trama do marxismo e começou a pregar a respeito de um iminente apocalipse nuclear.
Jim Jones. Via: AP
De fato, inclusive chegou a especificar uma data, 15 de julho de 1967, e sugeriu que após o apocalipse, um paraíso socialista chegaria à Terra. Ocorreu o que todos sabemos: nada. A data limite do fim do mundo veio e foi-se sem holocausto nuclear. Nos anos seguintes, Jones abandonou todas as pretensões do cristianismo e se revelou como um ateu que simplesmente tinha usado a religião como uma ferramenta para legitimar seus pontos de vista.
No início da década de 1970, o ambicioso pastor realocou a sede de sua organização em San Francisco enquanto abria um templo em Los Angeles. Em San Francisco, o homem virou uma figura poderosa, ganhou o favor dos funcionários públicos e dos meios de comunicação, doou dinheiro a numerosas causas beneficentes e entregou os votos para vários políticos no momento das eleições.
O Templo dos Povos. Via: AP
O Templo dos Povos dirigia programas sociais e médicos para os necessitados, incluindo um restaurante gratuito, reabilitação para viciados e serviços de assistência legal. A mensagem de Jones de igualdade social e justiça racial atraiu um grupo diverso de seguidores, incluídos jovens idealistas que queriam fazer algo significativo com suas vidas.
Mas enquanto a congregação de Jones ia crescendo -as estimativas em 1977 estavam em 20.000-, começaram a surgir reportagens negativas sobre o homem que seus seguidores chamavam de "Pai". Os ex-membros descreveram que foram obrigados a abandonar seus pertences, seus lares e inclusive a custódia dos filhos. Contaram que apanharam muito e que Jones organizava falsas curas de câncer nos cultos.
Jones durante um sermão. Via: AP
À medida que o escrutínio da mídia aumentou e seu perfil político tornou-se mais complicado, o homem ficou preocupado que seu estado religioso isento de impostos nos Estados Unidos fosse revogado. Também se tornou cada vez mais paranoico com respeito aos serviços de inteligência do país. De modo que em 1977, mudou o Templo de novo, mas desta vez para um assentamento que estava construindo desde 1974 na Guiana.
Chamava "Jonestown" e prometia construir uma utopia socialista, ainda que a realidade não seria tão agradável como pregava.
Jonestown
Entrada de Jonestown. Via: Wikimedia Commons
O lugar ocupava uma extensa área, mas tinha solo muito pobre e água doce limitada. Ademais, era superpovoado e os membros do Templo viram-se obrigados a trabalhar muitas horas ao dia em jornadas maratonianas, submetidos a duros castigos se questionassem a autoridade de Jones.
Ilustração de Jonestown. Via: AP
Seus passaportes e medicamentos foram confiscados, muitos queixavam-se de que eram "comidos" por mosquitos e tinham doenças tropicais. Tinha guardas armados que patrulhavam o complexo no meio da selva para que ninguém fugisse e os membros eram alentados a que se informassem mutuamente sobre a obrigatoriedade de assistir a longas reuniões no meio da noite.
Vista aérea de Jonestown. Via: AP
Todas as cartas e chamadas telefônicas também eram censuradas. Jones, que então apresentava um declive mental muito sério e se convertera em um viciado às drogas, tinha seu próprio trono no pavilhão principal do complexo e comparava-se com Vladimir Lênin e com o próprio Jesus Cristo.
O homem estava convencido de que o governo, os meios e outros queriam destruí-lo. Ah, e também requisitou que os membros do Templo do Povo participassem em simulacros de suicídio no meio da noite.
Odell Rhodes, de 36 anos, professor de artesanato em Jonestown. Rhodes foi testemunha dos primeiros 20 minutos de suicídio em massa e depois conseguiu fugir da cena. Via: AP
No entanto, a tragédia que estava a ponto de ocorrer teve um pequeno de 6 anos como catalizador. Tim e Grace Stoen eram um casal seguidor de Jim Jones durante os primeiros anos do Templo na Califórnia. Em 1972, Grace deu a luz a um menino chamado John Victor Stoen, e Jones afirmou ser o pai. Para complicar as coisas sobre a paternidade, Tim assinou uma declaração juramentada que confirmava Jones como o pai de John.
O espaço depois do massacre. Via: AP
Quando Grace desertou da igreja em 1976, a mulher deixou seu filho com Jones, temendo que sua vida e a de John estivessem em perigo. Juntos, ela e Tim, abandonaram a igreja e pediram ajuda da justiça dos Estados Unidos. A verdade é que Victor não só não regressou jamais, senão que foi um dos mais de 300 menores de idade que morreram em Jonestown.
Leo Ryan. Via: AP
O caso de Victor e outros parecidos chegou ao ouvido do congressista da Califórnia Leo Ryan. O homem já escutara um monte de histórias de seus eleitores sobre membros de famílias que estavam retidos contra sua vontade em Jonestown, de modo que decidiu ir ali para investigar. Ryan chegou a Guiana em novembro de 1978, com uma delegação que incluía jornalistas e fotógrafos, junto com parentes preocupados de alguns dos membros do Templo do Povo.
Durante sua visita a Jonestown, o congressista Ryan conheceu uma dúzia de membros do Templo que queriam ir embora. Enquanto processava a papelada para ajudar os membros a voltar aos Estados Unidos, Ryan foi atacado por um membro do Templo com uma faca, mas o suposto assassino foi retido antes de que pudesse feri-lo.
Várias drogas espalhadas ao longo de uma mesa em Jonestown. Os investigadores descobriram a grande quantidade de drogas enquanto buscavam às vítimas do massacre. Via: AP
Finalmente, em 18 de novembro Ryan e um grupo de desertores de Jonestown saíram a uma pista de pouso próxima com a esperança de ir embora. No entanto, Jim Jones tinha enviado um grupo de membros armados do Templo -chamados "Brigada Vermelha"- e estes abriram fogo, matando Ryan, um desertor do Templo e três jornalistas, e ferindo outros onze. Os que sobreviveram fugiram e se esconderam na selva.
Folhetos de promoção de Jonestown. Via: AP
Quando os assassinos regressaram a Jonestown e informaram sobre suas ações, Jones rapidamente começou um encontro denominado a "Noite Branca", convidando todos os membros do Templo. Não era a primeira vez. Em várias ocasiões antes dos assassinatos, Jones organizou as reuniões da Noite Branca em que sugeria que as agências de inteligência americana atacariam logo a Jonestown; inclusive tinha montado falsos agressores ao redor do lugar para agregar um ar de pseudorrealismo aos procedimentos.
Folhetos de promoção de Jonestown. Via: AP
Ante este hipotético cenário de invasão, Jones oferecia aos membros do Templo várias opções: ficar e lutar contra os invasores imaginários, dirigir-se à URSS, dirigir à selva da Guiana ou cometer um "suicídio revolucionário" (isto é, um suicídio em massa como ato político de protesto).
Nas ocasiões anteriores, quando os membros do Templo simulavam votar pelo suicídio, Jones testava sua escolha oferecendo pequenos copos que supostamente continham veneno e pedia que bebessem. Todos o faziam sempre. Após um tempo, Jones revelou que o líquido não continha veneno, mas que em algum dia o faria.
Na última Noite Branca, de 18 de novembro, Jones não estava testando seus seguidores do Templo, estava matando todos.
Jim Jones à direita. Via: AP
Os membros mais jovens foram os primeiros a morrer, já que os pais e enfermeiras usaram seringas para pingar uma potente mistura de cianureto, sedativo e pó de suco de fruta nas gargantas das crianças. Segundo os relatórios, Jones obteve uma licença em algum momento anterior que permitia o armazenamento de cianureto.
Depois, os adultos formaram fila para tomar a beberagem envenenada enquanto os guardas armados rodeavam o pavilhão.
O dia do suicídio coletivo. Via: AP
Ainda que pareça inacreditável, o ritual teve sobreviventes em Jonestown. Uma das histórias mais notáveis pertence a Hyacinth Thrash, uma idosa afro-americana que dormiu dentro de sua cabana durante toda a "noite branca". A mulher acordou de manhã seguinte e viu centenas de corpos espalhados pela comunidade.
Imagem aérea do ocorrido com os corpos espalhados. Via: AP
Quando as autoridades guianenses chegaram a Jonestown no dia seguinte, encontraram centenas de cadáveres espalhados pelo chão. Muitas pessoas tinham perecido abraçados um ao outro. Jim Jones, de 47 anos, foi encontrado em uma cadeira, morto por uma ferida de bala na cabeça, provavelmente disparada por ele mesmo.
O dia após o massacre. Via: AP
A cifra de mortos em Jonestown em 18 de novembro de 1978 foi de 909 pessoas, um terço era de crianças. Algumas pessoas conseguiram escapar à selva nesse dia, enquanto ao menos várias dúzias a mais de membros do Templo do Povo, incluídos vários dos filhos de Jones (e a senhora Thrash), salvaram-se de uma das cenas mais terríveis e incompressíveis do século XX.
Fonte: Huff Post.
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Comentários
Vamos conspirar?
https://conspireassim.wordp...
Na nos dias atuais isso não acontece,porque o povo anda mais esperto, e não cai numa furada dessa !
Gente estúpida...
Na verdade jim lixo convenceu, apenas os babacas e irracionais a cometerem suicídio !
Se fosse na atualidade, petistas, psolistas e todas esta caquerada teria mais um ídolo. O problema dos jumentos é que um dia eles zurram.